dezembro 24, 2009

O CASO DO MENINO SEAN, UM CASO LAMENTÁVEL

Dizia a minha mãe: - “Quando a cabeça não dá, o corpo é quem padece”. Sábias palavras, signifiquem elas o que quer que seja. De qualquer forma, quando a estupidez e os interesses mesquinhos (mesmo sob o manto do tal “amor”) prevalecem, há sempre muito sofrimento e dor.

Estou-me referindo ao caso do menino Sean, cuja mãe, brasileira, morreu no parto de outra filha, de outro casamento, aqui no Brasil e cujo pai, americano, devia ser, pela lógica, o responsável pela criação e educação do menino. No entanto, num ato de estupidez amorosa, o padrasto brasileiro pediu a guarda provisória do menino. E noutro ato de estupidez jurídica, algum juiz a concedeu. Afinal, o sobrenome ilustre do requerente deve ter pesado, e muito, nesta decisão. Lins e Silva, uma família de juristas!

Cinco anos de luta. Entre o verdadeiro pai e a família da mãe. Cinco anos em que não se pensou, nem por um minuto, primeiro, na lógica; segundo, na lei; terceiro, nas implicações internacionais e, quarto, na cabeça da própria criança, centro de uma disputa kafkiana, entre juristas de dois países.

Lógica: se o pai é vivo, e capaz, e contra ele não pesa nenhuma acusação de abandono ou maus tratos, não se pode simplesmente, por um ato discricionário de uma avó ou de quem quer que seja, abolir o seu direito paterno. Isso não cabe em nenhuma cabeça. Por maior que fosse o amor da nova família à criança. Um acordo, nesses casos, tornaria a transição menos dolorosa para todas as partes envolvidas, sem necessidade de transformar um caso familiar em incidente diplomático internacional.

E entramos, então, nos aspectos legais e internacionais. A legislação brasileira sempre esteve a favor do pai americano, e somente os recursos protelatórios, totalmente descabidos e absurdos, avalizados pelo sobrenome ilustre da família, é que conduziram o caso para o terreno do Direito Internacional, que tem tratados muito definidos quanto ao assunto. Tratados de que o Brasil é signatário, não podendo, portanto, deixar de cumprir. Porque isso se constituiria em sequestro, simplesmente, sequestro de menor, agravado pelo fato de se realizar em pleno estado de direito e contra todas as evidências legais.

E, finalmente, não se pensou na própria criança. Se a Lei estava a favor do pai, por que não se tentou, antes de qualquer medida, o mais simples: um acordo, um acordo amigável, entre as duas famílias? Em benefício da criança. Que poderia, muito bem, conviver tanto com o pai americano quanto com a família brasileira, para benefício do menino, que teria o privilégio de conviver com duas culturas, duas línguas, dois países.

Mas, não: preferiu-se o confronto. Com o risco de, ao final, saírem todos perdendo, e deixando sequelas difíceis de serem cicatrizadas. E o pior: mesmo sabendo a família brasileira, de ilustres juristas, que seria uma causa perdida. Ou alguém duvida de que eles sabiam das condições legais de sua demanda? Claro que sabiam que só remotamente ganhariam a causa, muito remotamente.

E nessa luta absurda, envolveram-se elementos que não podiam nem deviam ser envolvidos, principalmente de parte dos Estados Unidos, quando seu próprio presidente foi instado a pressionar o governo brasileiro por uma solução que era eminentemente jurídica, e não política. Até mesmo um senador americano boicotou a aprovação de tratado internacional que beneficiaria o Brasil, entre outros países, por causa do menino.

E, ao final do caso, o fato de o governo americano fretar um jatinho para levar para casa o pai e a criança deixou bem clara a mensagem de que não confiava na Justiça brasileira, na sua visão, pusilânime, demorada e sujeita a mudanças. E isso é totalmente lamentável, em termos internacionais!

E a família brasileira, por sua vez, veio a público, também pressionando o Presidente da República que interviesse no caso, como se um presidente, num estado de direito, pudesse transformar-se em juiz de um caso cuja legislação é clara, tanto em termos nacionais quanto internacionais.

Até os argumentos de que é “tradição” uma criança ser criada pela avó materna, na falta da mãe, são falaciosos e inventados para dar apelo emocional ao caso e, com isso, conquistar a simpatia da imprensa e da opinião pública. E mais: dizer que a criança foi “vendida” em troca da aprovação de um tratado, por alguns milhões de dólares, é só um ato de desespero, que não deve ser levado em conta.

Portanto, um caso simples de lógica, de respeito à lei, de compreensão da vida, quase se transforma em incidente internacional. Se estivéssemos em outras épocas, seria até o caso de desencadear-se uma guerra entre dois países amigos, por uma questão de caráter puramente familiar. Não estou exagerando, pois a História, desde a guerra de Tróia, está cheia de exemplos em que muitas vidas foram perdidas em lutas fratricidas por encontrarem as nações o pretexto para a guerra em fatos corriqueiros da vida particular, transformados em “honra nacional”.

Se eu fosse o pai dessa criança, moveria mundos e fundos, lá dos Estados Unidos, para processar por perdas e danos ao menino a família brasileira, como uma lição para que nunca mais, no mundo, acontecesse um fato lamentável como esse, de tentativa de burlar leis nacionais e internacionais, além da própria lógica da vida, por motivos sentimentais ou por quaisquer outros motivos.

Fique, pois, o caso do menino Sean como uma lição, para todos, de como um ato aparentemente de “amor” pode transformar-se num incidente de proporções incontroláveis, por ser, ao verdade, ao fim e ao cabo, um ato de insensatez humana.

“Quando a cabeça não dá...”

Nenhum comentário: