abril 26, 2009

CUIDADO! ELES AINDA ESTÃO À ESPREITA!

O neoliberalismo levou um belo chute na bunda. Mas, como todo morto vivo ou monstro de filme b de terror, respira e dá sinais de, a qualquer momento, atacar novamente.

O mais impressionante, na cara de pau desses neoliberais, é que estão tentando buscar fôlego justamente no seu inimigo número um: o Estado.

É claro que não espero que o mundo se torne socialista de repente, nem que o capitalismo e seus tropeços periódicos sejam enterrados. O que eu espero é que a política neoliberal, com todos os seus cânones de total entrega dos destinos das nações ao mercado regulador, como um deus ex-machina, com sua pregação desavergonhada de Estado mínimo, deixando na mão milhões de trabalhadores, espalhando a fome e o desespero pelo mundo, seja devidamente enterrada, com uma estaca fincada bem no meio do coração.

Mas não é bem isso o que se vê por aí. Principalmente aqui, no nosso País, em que os demotucanos parece que não assimilaram bem a lição que levaram e continuam a estrebuchar de dentro de seus túmulos pútridos, em consequência da pregação monótona de certa mídia que anda por aqui e que deveu favores à ditadura e, agora, agarra-se de unhas e dentes à pregação neoliberal dessa gente.

Alguns sinais de como essa gente age estão aí, visíveis, tanto na pregação sistemática dos corvos que grassam e grasnam nas redações de jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão, na internet, como em projetos e resoluções de políticos em cargos mais ou menos importantes.

Vejamos dois desses sinais.

O primeiro é a questão dos impostos. Falar da carga tributária é ibope certo para presidentes de associações que congregam tanto industriais quanto latifundiários ou agronecistas. Todos latem unanimemente contra os impostos, principalmente, claro, os federais, já que a União está nas mãos de seus opositores. Sobre impostos municipais e estaduais eles se calam ou falam apenas en passant, como se todos os males do mundo, em termos de cobrança de impostos, estivessem nas costas do Governo Federal. Claro, há prefeitos e governadores demotucanos que não querem nem ouvir falar em redução de seus impostos ou, mesmo, em reforma tributária. O medo de perder receita, nesses rincões, é enorme.

Ora, imposto, para essa gente, rima com Estado mínimo. Ou seja, querem que o Estado interfira o menos possível em seus negócios, para que seus lucros sejam os maiores possíveis. E nada de impostos. Afinal, para eles, a iniciativa privada resolve todos os problemas. E aí está o primeiro e escandaloso erro de raciocínio dessa gente: as empresas têm, sim, de dar lucros, para crescer, produzir emprego e remunerar seus acionistas, mas não têm nenhuma outra função social que não sejam, primeiro, gerar empregos e, segundo, pagar impostos para que seus lucros não sejam tão escandalosos que impeçam um mínimo de justiça social.

Bancos, indústrias, agronegócios etc. não têm nem podem ter obrigações sociais caritativas. Não têm que ter escolas, projetos sociais e outras baboseiras desse tal marketing social que serve apenas de cala boca, de esmola, para satisfazer a consciência dessa gente e tentar manter os pobres longe de seus domínios.

A verdadeira justiça social se faz através dos Governos, do Estado, com o dinheiro dos impostos de todos os cidadãos e, principalmente, dos impostos pagos pelos empresários. Os países mais desenvolvidos socialmente são aqueles que têm altas cargas tributárias. Se o governo não gasta bem, se é corrupto, se não promove a justa distribuição de renda, ao converter o dinheiro dos impostos em programas sociais, em educação e saúde, em infraestrutura etc., tem-se que repensar o Governo, em dar ao povo a oportunidade para escolher melhor seus governantes. E isso passa, principalmente, pela eliminação dos políticos como classe. Não pode existir uma “classe dirigente” ou uma “classe política”. Por isso, uma reforma política tem de ser feita para que se acabe de uma vez por todas com isso. Como? Talvez impedindo a reeleição para um mesmo cargo de todo e qualquer ocupante de qualquer posto público do Executivo e do Legislativo. E também formas de eleição para os tribunais do Judiciário, nem que sejam eleições fechadas, mas se acabe com qualquer cargo vitalício. Em vez de investirmos contra os Poderes da República, é necessário que se revitalizem tais poderes, que se busquem novas formas de aplicar a velha e boa democracia.

Mas, não é bem isso o que se vê por aí. Demonizar as instituições não é o melhor caminho. Se temos deputados, senadores, vereadores, governadores, juízes corruptos é porque ou os escolhemos mal (e sempre os mesmos, pela famigerada reeleição, viciada pelo poder econômico ou pelo poder de mídia de alguns poucos) ou não os escolhemos e eles ficam lá, com suas togas eternas, a fazer e falar bobagens, apegados ao poder, como jabuticabas ao tronco.

O segundo sinal da permanência das ideias ultrapassadas dos neoliberais aparece em pregações e projetos que buscam dar à iniciativa privada ou ao mercado as funções de que um verdadeiro Estado democrático não pode abrir mão. É a famosa privatização. É dar à raposa o direito de tomar conta do galinheiro, na esgarçada metáfora. Privatiza-se a saúde, e o que vemos são planos privados de assistência médica a enfiar a faca em seus usuários, prestando serviços e atendimento sofríveis por preços extorsivos. Privatiza-se o transporte público das cidades, esquecendo-se de que o direito de locomoção é básico, além de constitucional, e os meios de transporte não podem ser objeto de lucros exorbitantes, como acontece em quase todas as cidades.

E agora (como exemplo de suma cara de pau dessa gente), o alcaide demotucano de São Paulo faz aprovar na Câmara, pelos seus capachos, um projeto que dá direito à iniciativa privada de desapropriar um imenso território no centro da cidade, com a desculpa de recuperar uma área degenerada e corrompida pelo descaso de inúmeros prefeitos, cujo apelido, “cracolândia”, dá bem a dimensão do estado em que está. Ora, desapropriar prédios e terrenos degradados é função do Estado e não de empresas nacionais ou multinacionais que só visam ao lucro. É tirar de muitos para dar a poucos. É simplesmente vergonhoso e, acredito, inconstitucional tal idéia estapafúrdia que, se conseguir vencer, dará bem ideia de como pensam os nossos neoliberais demotucanos que pretendem tomar conta do País nas próximas eleições, se o povo não se conscientizar de tal tipo de estupidez.

Eles não emendam. Mesmo com toda a encrenca em que meteram todas as nações do mundo, provocando recessão, fome, desemprego, com suas políticas de estado mínimo, de todo o poder ao mercado. Mercado que, agora, se socorre dos governos que eles tanto combateram e exauriram com suas idéias.

Portanto, cuidado, povo, muito cuidado. Eles estão aí, à espreita, prontos para começar tudo de novo!

abril 22, 2009

A FELICIDADE

Sim, o título lembra bem a canção de Tom: “A felicidade é uma gota orvalho numa pétala de flor, brilha tranquila, depois de breve oscila e cai como uma lágrima de amor”.

Pois é, o poeta persegue a felicidade, mas tem consciência de sua brevidade. E nós, os que não somos poetas, também temos a mesma visão poética desse que é um dos objetivos mais comuns de nossa vida: a busca da felicidade?

Pra começo de conversa, não acredito na felicidade.

Não, não sou nenhum pessimista, nem uma pessoa depressiva a chorar pelos cantos, desanimado da vida, maldizendo a existência ou com tendências suicidas. Apenas não acredito no “ente” abstrato, metafísico, chamado de “felicidade”, algo como um estado permanente placidez. Eu ia dizer estado de “idiotia e estupidez”, mas contive-me a tempo, não o suficiente para, no entanto, deixar de reconhecer a tal “busca da felicidade” pelos humanos é uma das coisas mais idiotas que pode fazer qualquer pessoa.

Tentemos explicar melhor. A coisa começa, como quase tudo de nossa chamada civilização ocidental, lá na Grécia antiga. Ainda não se conhece o vírus que atacou uma grande quantidade de sábios gregos que os transformaram em filósofos. E o filósofo, como uma vez me explicou minha irmã, quando eu tinha os meus seis, sete anos, é uma pessoa que fica o dia inteiro pensando assim: “o meu boi morreu, eu vou morrer também...” Ou seja: pensando no tal sentido da vida. Como eram pessoas inteligentes, os tais filósofos gregos, de tanto pensar nisso e não chegar a conclusão nenhuma, inventaram a metafísica. Tudo que não se explica, no mundo físico, palpável, pertence ao inefável, ao transcendente, à metafísica.

Assim, criaram entes que seriam os modelos ideais de cada coisa concreta. Por exemplo, teria de haver, para explicar a existência das pedras, uma pedra primeira, transcendente, que guardaria em si todas as características das pedras reais. Talvez uma espécie de modelo, de pedra ideal.

Com isso, estavam criados os entes metafísicos, abstratos, transcendentais, absolutos, que conteriam todos os nossos sonhos e objetivos, ou explicariam o tal “sentido da vida”. E muitos chegaram à conclusão de que o homem está na terra para ser feliz, numa espécie de missão impossível.

Desde essa época, a humanidade, ou parte dela, segue nessa busca, como se a felicidade fosse um estado permanente de doçura, de esplendor, de placidez, onde nada mais importa, tudo se resolve e ali não há mais nada, nem mesmo vida, acrescento eu.

Ora, a vida, quem se importa com a vida? Se o mais importante é ser feliz?

Para mim, esse tipo de pensamento, entranhado no inconsciente de bilhões de pessoas, ao longo de dois, três mil anos, ou mais, tem entorpecido a nossa visão para as coisas simples da vida, como a “gota de orvalho numa pétala de flor”. Porque a vida é constituída de momentos, momentos bons e gostosos, momentos tristes e terríveis. Ia repetir Shakespeare, com o seu som e fúria, mas isso já está muito manjado. Todo mundo conhece. Conhece mas não entende. Imagina-se que é apenas retórica do bardo (que sabia de muitas coisas). Não, a tal felicidade não existe, como não existe a “pedra de todas as pedras”, a pedra ideal.

Não percamos tempo na sua busca, porque, enquanto a buscamos, deixamos, muitas vezes, de viver os momentos que a vida nos proporciona. Não estamos aqui para buscar o que não existe, mas estamos no mundo para a coisa mais prosaica que a natureza pôs ao nosso alcance: para viver, apenas, e nada mais.

abril 21, 2009

TEXTOS SÃO NAVIOS

Nós somos cais, trapiches, embarcadouros. Os textos – contos, livros, poemas, falas, dicionários... – são navios. Partem dos cais em busca de outras terras, de outros trapiches, de outros cais. Sempre.

Depois de partirem, não temos mais como controlá-los. Navegam em mares calmos ou revoltos, enfrentam procelas, às vezes naufragam e voltam às ondas, mas seguem impolutos em busca de seus destinos.

Mesmo quando esse destino se faz de ilhas misteriosas, envoltas em brumas, nossos navios não desistem: arrebentam-se nos abrolhos e não batem nunca em retirada.

Transportam esses navios nunca fantasmas, sempre o nosso mais íntimo intuito de oferecer aos outros aquilo que nos arrebenta por dentro, quando não conseguimos enfurná-los em cascos e velas.

Mortais e estúpidos, não percebemos que esses navios não se perdem nunca. Ficam por aí, a assombrar, mesmo que não encontrem algum cais que os receba, porque são fruto de nossa mais lídima luta por marcar nossa existência. Mesmo que o vento os leve a regiões ignotas, só fato de terem zarpado já faz deles, dos navios que saem de nossos cais, um marco, um ponto que seja no horizonte azul.


Povoam nossos sonhos todos os atos de comunicação. Alcançamo-los quando menos esperamos, ao lançar nossas redes, através de sinais que nossas sinapses cerebrais captam, sem nos darmos conta. Assim, de repente, mesmo quando dormimos, sonhamos e repovoamos os mares, fazemo-los cúmplices de nosso destino de buscar sempre o outro.

Sim, são navios os nossos textos. Atiremo-los aos mares e aguardemos, com a íntima certeza (senão não lhes confiaríamos nossos segredos) de que há neles marinheiros prontos a lutar por não deixar que sigam vazios à procura de seus portos, de suas ilhas, de seus cais ou de seus continentes.

abril 16, 2009

POR QUE SÃO SEMPRE OS MESMOS?

Já está ficando cansativa esta história, mas vamos lá: por que não se renovam nossas casas legislativas (Congresso, Assembleias e Câmaras)?

Porque o povo vota sempre nos mesmos candidatos.

Não, isso é simplismo. É reduzir um problema complexo a um só culpado, o povo.

Precisaríamos, talvez, para uma resposta razoável, pesquisar a história, a sociologia e artes de comunicação, além de filosofia e sei lá quantas outras disciplinas ou ciências.

Não é nosso objetivo, nesse breve artigo, nem nos estender muito nem elucubrar grandes teorias. Nem por isso, vamos ficar no simplismo de culpar apenas uma das pontas da causa.

Mas vou levantar, além das hipóteses históricas (clientelismo, reeleição, partidos políticos sem representatividade, conservadorismo etc.) a hipótese da manipulação do povo pelos meios de comunicação. Não é, de forma alguma, o único motivo de votarmos sempre nos mesmos, mas é apenas um desses motivos. E um bom motivo, sem dúvida.

Pode-se manipular a vontade do povo?

A resposta é: sim, pode-se e não apenas se pode como se manipula o tempo todo a vontade do povo através dos meios de comunicação (e nem vou falar dos nazistas...).

A grande imprensa teve seu boom no século XIX: basta ler Balzac (principalmente As Ilusões Perdidas) que odiava jornais e jornalistas, porque os considerava manipuladores e sem escrúpulos.

A grande imprensa (jornais e revistas) ganhou a companhia de outros meios (rádio, televisão, internet...) e ganhou ares solenes, com tentativas de código de ética e outras formas de passar a imagem de isenção. Tudo bobagem: não há mídia isenta.

A melhor resposta que conheço para a pergunta: por que nos comunicamos? – é, sem dúvida, esta: comunicamo-nos porque queremos influenciar o outro. Todo processo de comunicação humana está centrado neste aparente egoísmo: eu falo (ou escrevo...) porque quero influenciar alguém.

Assim, a mídia moderna existe para influenciar a nós, seus consumidores. A grande sacada moderna é haver dezenas, centenas, talvez milhares de comunicadores, com visões diversas da realidade, a tentar influenciar-nos com suas idéias (como estou eu fazendo agora a uns poucos que me leem).

No entanto, pulverizados em centenas e milhares, os comunicadores na verdade nada comunicam e nada influenciam. Só o fazem quando concentrados em grandes meios (redes de televisão, de rádio ou de jornais e revistas). E esses estão todos tentando passar a visão de seus fundadores que, por sua vez, dependem de seus grandes anunciantes.

E quem são os grandes anunciantes que, no frigir dos ovos, mandam na grande mídia? Bem, esses todo mundo sabe quem são: estão aí nas grandes Federações de indústria, de comércio, de bancos...

E pensam todos do mesmo modo (embora até divirjam nos detalhes): manter o status quo, para que seus lucros não sofram abalos. Ou seja, são... conservadores (mesmo que tenham visões espetaculares de modernidade, de futuro etc.). Só confiam em pessoas que comunguem seus interesses.

Vai daí que os empresários dos meios de comunicação (que também são conservadores, senão não seriam empresários) são financiados, custeados, mantidos pelos conservadores banqueiros, donos de indústrias, grandes comerciantes, fazendeiros, importadores, exportadores, donos de agronegócios (novo nome para os velhos latifundiários) etc... E todos sabemos qual é a verdadeira ideologia dessa gente.

E o que tem a ver a ideologia dos empresários (tanto donos dos grandes conglomerados de comunicação quanto seus fiadores) com a eleição dos mesmos políticos sempre?

De uma forma declarada ou sutil, os políticos são eleitos com a grana dessa gente, com o apoio dessa gente. Eles é que são os grandes eleitores, não o povo, que elege, sim, seus representantes, mas em muito menor número do que os representantes dos empresários, da gente que tem grana e que realmente manda no País.

Por isso e por muitos outros motivos, mas principalmente por isso, votamos (levados pela vontade dos senhores, sutil ou declaradamente apoiados pela mídia conservadora) sempre nos mesmos. Porque são confiáveis para quem os patrocina e financia.

Abram-se parênteses: você já pensou como ganha fácil uma eleição gente que trabalha na televisão? Vide o falecido Clodovil: teve a maior votação para deputado em São Paulo. Por que será? E olhe: nem estou julgando o valor de a ou b ou c... eu, hem? Fechem-se os parênteses. Ponto.

Assim, acabar com a reeleição?

Nem que a vaca tussa, voe e faça outras peripécias. Temos que engolir os mesmos, sempre os mesmos, ainda que alguns de nós votemos (e às vezes elegemos) alguns outros, até com boas intenções, mas que, para sobreviver, acabam quase sempre aderindo ao clube e tornando-se também eles os mesmos, sempre os mesmos... Sempre!

abril 14, 2009

A RESSURREIÇÃO DOS MORTOS

A tal semana santa já passou. A igreja já pregou mais uma vez o seu deus na cruz e já o ressuscitou. Mas, por aqui, os mortos continuam renascendo. Continuam pulando de seus túmulos para nos azucrinar a vida. Agora mesmo, o Serra, o impoluto Governador de São Paulo, acaba de trazer de novo à vida o falecido ex-ministro da Educação de FHC, o senhor Paulo Renato. E segundo os noticiários, respira sem aparelhos e tem a língua solta, para falar as bobagens de sempre.

Mas, não é só na política que os mortos-vivos (por que o povo vota sempre neles é a pergunta que não quer calar) pulam de seus túmulos, em qualquer época, para ações as mais descabidas (aparentemente), mas, na verdade, contribuindo para ações sutis e muito bem orquestradas de gente que quer ressuscitar fantasmas muito mais poderosos.

Vamos tentar entender esse imbróglio.

Defensora dos tucanos e grande eleitora de Serra, a Folha de São Paulo, há tempos, tentou vender a idéia de que a ditadura brasileira, comandada por meia dúzia de gorilas que tomaram o poder no golpe de 1964, não foi tão terrível quanto outras do continente. Até meio pelo contrário (se se pode dizer assim), foi bastante complacente e generosa, podendo se chamada de “ditabranda” (um neologismo pavoroso, não só pela semântica).

Ou seja, copiando aquele comercial que diz que nossos japoneses são melhores do que os de outros países, nossos gentis militares foram melhores do que os vilelas ou do que os pinochês de nuestros hermanos. Mataram menos gente, sim. Torturaram menos gente, sim. Se bem compararmos com a violência ali pela Cordilheira ou ali pelo Plata. Como se isso fosse um mero concurso de “vamos ver que arranca mais orelhas” e nós fôssemos os distintos perdedores. Como se tortura e morte em porões, por motivos políticos, se contabilizassem apenas pela quantidade de mortos, feridos, desaparecidos e torturados.

Agora, o Estadão ameaça também entrar no coro dos que desejam a ressurreição dos mortos mais fantasmagóricos de nossa História, ao dar voz a uma senhora que serviu (e muito bem) aos governos militares, para vir a público e declarar que “hoje em dia, pela força de versões sempre repetidas, a atual geração aceita que o 31 de Março foi um golpe militar. Não foi. O verdadeiro golpe foi tramado por Brizola e deu errado. As Forças Armadas cumpriram o dever constitucional de manter os Poderes funcionando: Judiciário, Congresso e Executivo.”

Que é isso, cara pálida?

As Forças Armadas mantiveram os três poderes funcionando, sim. Lembram como? O Executivo com a borduna, a prender, matar, exilar, torturar a torto e a direito. O Congresso, amordaçado pelos puxa sacos da Arena, ameaçado de fechamento (e depois a ameaça se cumpriu!) e de cassações. O Judiciário, obrigado a cumprir as leis draconianas dos atos institucionais, que baniram direitos como habeas corpus.

Sim, os poderes, podres poderes, funcionavam!

Então, qual é o problema se a senhora Sandra Cavalcanti levanta de seu túmulo e vem escrever uma coluna política no Estadão? É a opinião dela e não do jornal...

Ora, vejamos. Claro que o jornal se exime da responsabilidade de artigos assinados, em termos legais. Mas, eticamente, se convidou tal “personalidade” para escrever, é porque, no fundo, endossa o que ela escreveu. Ou eles não sabem a opinião de quem convidam para suas páginas de editoriais? Ou acham que é por seus grandes serviços prestados à nação, que também o falecido Fernando Henrique Cardoso frequenta suas páginas periodicamente e citado a todo instante na imprensa tucana, como na Folha e naquela revistinha de quinta, chamada Veja?

Ora, senhores e senhoras, estão orquestrando, e muito bem, um movimento típico de nossa imprensa: lançam foguetes de prospecção, verdadeiros bois de piranha, ou seja, batem e recuam, como fez a Folha de São Paulo com a tal “ditabranda”, mas recuam estrategicamente, porque o estrago já foi feito. Já plantaram a ideia, já jogaram sob as penas da galinha o ovo da serpente.

O sábado de aleluia, com a ressurreição dos mortos, e sua consequente revisão do passado, está apenas começando, neste pobre País, destinado a conviver com esse tipo de gente.

Fiquemos, pois, espertos.

abril 07, 2009

CRIME PERFEITO

Há todo um folclore em torno do crime perfeito. Aquele que é cometido por alguém que tem motivos para cometê-lo, vai-se beneficiar do crime, mas nunca será preso, por não haver provas contra ele.

Pensamos, sempre, quando se fala de crime perfeito, em produções de Hollywood ou em romances noirs, aquelas tramas complexas que só os grandes escritores e roteiristas conseguem inventar, sem se perder em suas armadilhas. Ou nos grandes vilões de histórias em quadrinhos, cujos objetivos são o de eliminar o herói e conquistar o mundo, com elucubrações tenebrosas e máquinas destruidoras.

Todos eles, entretanto, acabam atrás das grades, desmoralizados pela astúcia e pela coragem de detetives malucos e introspectivos ou pela força bruta dos super-heróis.

Então, nossa imaginação ferve, em busca de tramas mirabolantes que possam levar ao crime perfeito. Como driblar a insistência lógica de Columbo ou a astúcia de Sherlock Holmes?

Envolvidos por essa idéia de que não existe o crime perfeito, esquecemo-nos de que tudo isso é ficção. E, muitas vezes, da melhor qualidade. A desafiar nossa inteligência, a alimentar nosso cérebro de enigmas e soluções complicadas. Esquecemo-nos de que há uma realidade à nossa volta, muito mais desafiadora e muito mais tenebrosa.

O crime perfeito existe, sim. E bem sob os nossos olhos, sob os nossos narizes. E ocorre quase todos os dias. E não estou falando das chacinas, não. E não estou falando dos milhares de assassínios que as nossas polícias não conseguem resolver, porque não têm investigadores suficientes, não têm bons e suficientes laboratórios de criminalística, não têm viaturas, não têm salários...

Não são crimes perfeitos. São crimes não investigados, não resolvidos.

Estou falando de outra espécie de crime. Esse também tão grave quanto assassínios e chacinas. Estou falando de falcatruas que corroem diariamente as finanças públicas, o nosso rico dinheirinho de impostos, que suamos para pagar. Estou falando da roubalheira feita por dezenas, centenas, talvez de milhares de indivíduos inescrupulosos que assaltam todos os dias os cofres da Nação.

São crimes perfeitos, sim, porque roubam e todos sabem que eles roubam e se beneficiam do produto de sua rapinagem, com suas mansões e jatinhos executivos, com suas gastanças em paraísos turísticos, com sua vida nababesca.

E mais perfeitos ainda se tornam esses crimes porque os ladrões, conhecidos, reconhecidos, não vão para a cadeia.

E não vão porque obtêm habeas corpus do presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, ou de qualquer outro togado de nossa Corte Suprema.

É ou não é um crime perfeito?

abril 03, 2009

"ESSE É O CARA"

Não, não resisto. As manchetes de jornais reproduzem a frase. Rádios e televisões repetem a cena. O mundo comenta. Interpreta. Destaca.

Na reunião das vinte nações mais poderosas do planeta, Obama, o presidente americano, brinca com Lula e aperta-lhe afetuosamente a mão: “Esse é o cara. Eu adoro esse cara. É o político mais popular do mundo”.

Aí, fico pensando e rio comigo mesmo: enquanto isso, lá em Higienópolis, certo ex-presidente deve estar retorcendo as tripas, numa diarréia de inveja e ciúmes. Deve estar pensando: “Eu! Eu sou o cara. Não esse metalúrgico bronco e barbudo! À merda minha sociologia! À merda meus diplomas! Tudo à merda, por esse... esse...” Não conclui a frase, que sairia ofensiva ao americano, lembrando que um dia afirmou ter um pé na cozinha.

E nas demais hostes tucanas? Penas voando. Bicos batendo de indignação. Consternação geral. Os articulistas daquela revistinha semanal sem vergonha, órgão oficial da tucanada, devem estar sem dormir, sem tomar seu uísque neoliberal no bar da moda, matutando um jeito de anular o estrago do sucesso do Lula, com a denúncia de mais algum escândalo forjado em suas mesas de mogno extraído ilegalmente da Amazônia.

E os demos? Ensimesmados na sua falta de criatividade, nem para ranger os dentes eles saem da mediocridade, para tentar qualquer reação que não seja destrambelhada. Por enquanto, nenhuma notícia de suicídio se confirmou.

Ah, e aquela ex-senadora, ex-candidata à presidência, ex-esquerda radical e agora amasiada ideológica de policiais sem eira nem beira? Conseguirá escapar de uma síncope? O tempo dirá.

Enfim, enquanto a banda desafina por aqui, com gente a morder o rabo de indignação, nós, brasileiros que elegemos o Lula, que sabíamos que o metalúrgico não precisa de diploma para ser o que é, rimos à socapa, aquele riso de quem tem guardado o melhor para o fim.

abril 02, 2009

O PODER LEGISLATIVO NÃO É UM MAL NECESSÁRIO

Uma série de escândalos tem abalado a credibilidade do Congresso Nacional – Câmara dos Deputados e Senado Federal. E as críticas da mídia repercutem na população, o que faz aumentar as críticas, numa ciranda de reclamações e cobranças.

Devagar com andor, no entanto, que o santo é de barro. Não são as instituições legisladoras – Congresso Nacional, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores – que devem ser alvo de protestos.

Expliquemos. Não pode haver democracia sem um Poder Legislativo, representante mais legítimo dos anseios e vontades do povo. Em nenhuma hipótese, sob pena de defendermos governos ditatoriais, pode-se esbravejar contra esse Poder.

A mesma mídia que esbraveja contra o senador fulano de tal por atos de improbidade foi exatamente a mesma que exaltou o seu partido ou contribuiu para sua eleição. É claro que sabemos que é impossível alguém ser totalmente isento, neutro, mas não pode nenhuma mídia – jornal, rádio, televisão ou qualquer outra - fingir que é isenta e manipular seus leitores a favor de tal ou qual partido político.

A mídia e nós, eleitores, somos igualmente responsáveis por aqueles que elegemos como nossos representantes. No entanto, passada a temporada de escândalos, votamos de novo nos mesmos, sempre nos mesmos. E a mídia apoia sempre aqueles a quem deve favores, sempre os mesmos.

Por isso, o debate em torno dos escândalos e malversações de dinheiro público que nossos “nobres” representantes têm protagonizado, em todas as esferas legislativas do País, tem que ser travado em torno de uma reforma política séria, sem protecionismos a partidos de direita ou de esquerda.

Não podemos continuar tolerando reeleições indefinidas de quem quer que seja.

Não podemos continuar tolerando a existência de trinta ou mais legendas partidárias, sendo que a maioria só existe para negociatas espúrias.

Não podemos continuar tolerando que a classe política seja constituída de indivíduos que são mais iguais que todos nós: chega de mordomias e privilégios a quem quer que seja. Que ganhem bem, muito bem, nossos representantes, mas que trabalhem honestamente como qualquer outro trabalhador, com ponto de presença e desconto de faltas.

Enfim, precisamos parar de espernear e esbravejar. Aproveitemos o momento e tomemos nas mãos as rédeas de um debate sério que busque acabar de uma vez e para sempre com esse sistema que privilegia os mais espertos em detrimento dos mais capazes.