novembro 30, 2017

DOIS EXEMPLOS ABSURDOS DA REFORMA TRABALHISTA







Não sou advogado. Apenas penso com os dois neurônios que ainda tenho. E com um pouco de lógica.

Dois artigos da reforma da CLT do governo golpista chamaram minha atenção: primeiro, que a ação trabalhista deve conter um valor específico e, segundo, se o reclamante (o empregado / operário) perder a causa, deve pagar as custas e o advogado do reclamado (da empresa / do capitalista).

Valor. Significa que, quando o empregado entrar com uma ação, ele deve explicitar que ela vale, por exemplo, 50 mil reais. 

Ora, uma ação trabalhista, na maioria dos casos, não reclama “valores”, mas DIREITOS, ou seja, ele se sentiu esbulhado por um patrão que não cumpriu a legislação (pelo menos, na sua percepção) e deixou de lhe pagar direitos legais. E esses pagamentos não feitos, se devidos e reconhecidos pela Justiça do Trabalho, refletirão sobre todas as demais verbas indenizatórias, como FGTS, férias, repouso semanal remunerado etc. etc. Como calcular tudo isso, se o trabalhador não tiver acesso à tabela de remuneração da empresa e a dados que só uma decisão judicial pode obter? É jogar para o trabalhador – a parte mais fraca – o ônus de buscar uma prova reconhecidamente difícil de obter, mesmo por experientes advogados trabalhistas, além do fato de que tudo isso tem que ser calculado em função de longos períodos até chegar ao período dos últimos dois anos (que é o reconhecido pela legislação para se reclamar direitos), com juros e correção monetária. Esse cálculo, em geral, é feito pelos peritos da Justiça do Trabalho, podendo ser contestado por ambas as partes, e devidamente julgado e homologado pelo juiz.

Pagamento de custas. A Justiça do Trabalho funciona, ou seja, sempre julga as causas que lhe são propostas. Mas é lenta. Uma ação trabalhista pode levar anos. E os patrões dispõem de advogados especializados – e caros – para protelar as ações, quando lhe convém. Os advogados trabalhistas, em geral, cobram seus honorários a partir de uma porcentagem da ação ganha. Se o trabalhador tiver que pagar, em caso de perda da ação, as custas de longas batalhas judiciais, de protelações provocadas pela empresa, e ainda mais os honorários dos dois advogados, sendo que os advogados patronais são, em geral, escritórios bem montados e muito bem remunerados, é óbvio que ele, depois de anos e anos, não terá certeza ou garantia de que poderá desembolsar as absurdas quantias necessárias. Ou seja, a lei provoca uma insegurança total para o empregado: a maioria preferirá aceitar as injustiças a ter de se submeter a uma possível situação de devedor da justiça, num futuro que ele não pode prever. 

Nos dois casos citados (e deve haver outros detalhes na nova legislação), o que pretendeu o legislador é inverter de forma cruel, ilógica, absurda, a relação de poder entre o leão (o capitalista) e a presa (o empregado), dando ao leão uma força desproporcional em relação àquela que ele já possui.

Se, com a legislação anteriormente em vigor, muitos patrões pouco se lixavam para o cumprimento de seus deveres legais para com seus funcionários, porque contavam com acordos na Justiça do Trabalho (em geral, favoráveis a eles) e com protelações que jogam os pagamentos devidos para datas tão distantes que, muitas vezes, o valor devido (mesmo com juros e correção monetária) é sempre inferior àquele que realmente tem direito o trabalhador, imagine-se agora como vão agir. Isso significa a diminuição atroz de ações trabalhistas, o enterro da Justiça do Trabalho, que se tornará, em alguns anos, totalmente ociosa e inútil. Além do fato de que vai simplesmente arrasar com a profissão de advogado trabalhista.

Eu acredito que as duas medidas sejam inconstitucionais. Mas, até que a nova legislação tenha casos julgados que possam ser contestados quanto à sua inconstitucionalidade junto ao STF, que costuma demorar até alguns anos para julgar, o prejuízo para os milhares de empregados e operários já terá sido imenso. Para alegria dos patrões, a quem serve a nova legislação.