julho 25, 2011

A OUTRA DROGA DA HUMANIDADE: O DESRESPEITO À VIDA


(Honoré Daumier - Don Quixote)


Não somos anjos decaídos, mas animais em evolução. Temos em nossa memória genética e em nosso inconsciente a luta pela sobrevivência, ao longo de milhões de anos. Nossa civilização, no entanto, tem uns poucos milhares de anos, que mal chegam a uma ínfima porcentagem da trajetória do homem, do estado de ameba ao de ser pensante.


Desenvolvemos, nesses poucos milhares de anos de consciência, de pensamento dito racional, crenças e valores que nos levaram para caminhos tortuosos, ainda mais tortuosos do que a evolução genética nos conduziu.


Criamos a metafísica e, com ela, as crenças absurdas em vidas além da vida, em deuses criadores ou fundadores, em seres inexistentes e, dentro de uma espiral de ignorância misturada com arrogância, construímos para nós mesmos a armadilha da falsa imortalidade.


Como seres razoavelmente inteligentes, temos construído, nesses últimos séculos, uma civilização tecnológica que nos dá a falsa impressão de seres superiores. Destruímos a natureza, em prol de valores consumistas e de total conforto. E, com isso, colocamos em risco o equilíbrio do próprio planeta onde vivemos, sem pensar na sobrevivência da raça humana.


Mais grave ainda: juntamos o ânimo guerreiro da luta pela sobrevivência a crenças em divindades que privilegiam a morte ao invés da vida. Construímos, com isso, uma verdadeira orgia de entidades metafísicas totalmente absurdas para justificar os atos de guerra, de matança, de assassínio, de submissão do outro e de covardia em relação a qualquer ser que julguemos inferior a nós.


Deuses e religiões se unem na mente do homem para justificar todos os atos de barbárie que se cometem em nome de valores não-humanos, de valores que trazem em seu bojo o sangue de ancestrais unido ao total desrespeito à vida. Porque adoramos deuses da morte e não deuses da vida.


Todos os livros ditos sagrados – que são a base do pensamento deísta do homem atual, de todas as partes da Terra – são livros que pregam a exclusão do outro baseada no princípio básico de que só os “irmãos em fé” podem agradar ao tal criador carniceiro. Todos os demais são relegados ao fogo do inferno, como castigo máximo, ou à não permanência junto ao deus ou a seus profetas.


Matar o outro, porque é diferente, está no DNA do homem pio, do homem que crê que seu deus é melhor do que o deus da outra tribo. Porque ainda somos divididos, por obra e graça do deísmo e suas religiões, em tribos que, no fundo, se odeiam e desejam a destruição da tribo inimiga. O deus de cada uma dessas tribos exige o domínio total e absoluto do mundo, mesmo que para isso seja necessário destruir todos os demais.


Não percebemos que o fundo de toda e qualquer guerra consiste em eliminar o diferente, por motivos tribais, mais até do que econômicos, como somos levados a crer, por teorias que buscam ofuscar o verdadeiro motivo de agirmos assim.


Os pensadores de todas as tribos, sejam do ocidente ou do oriente, estão definitivamente contaminados pelos conceitos deístas, pelas crenças absurdas em sobrevivência espiritual da humanidade, como se a vida que vivemos fosse apenas um estágio para uma vida melhor após a morte. E isso é arrogância, pura arrogância instilada pelas falsas crenças de tal modo, que ficamos cegos à vida e à natureza, ao mundo que nos cerca, que são a única coisa real que existe.


Perdemos tempo em pensar na “essência” das coisas, na perenidade do mundo, quando tudo ao nosso redor muda, transforma-se, evolui, dentro de leis naturais precisas e fundamentais, cujos princípios nos afetam de forma concreta e não inventada, como na crença em milagres ou em deuses.


Enquanto a humanidade persistir na interpretação de palavras toscas de livros sagrados; enquanto a humanidade ignorar as leis claras da natureza; enquanto a humanidade não se livrar das metafísicas idiotas, proclamadas por profetas ou falsos filósofos; enquanto a humanidade não substituir o culto da morte pelo culto da vida e passar a respeitar a vida como o único e insubstituível bem que possuímos, continuaremos a ter guerras, massacres, carnificinas, assassínios e ataques terroristas praticados por imbecis em nome de causas as mais absurdas possíveis, mas transformadas em formas de justiça por esse processo destruidor da racionalidade que se chama deísmo.


Até quando permitiremos que os deuses carniceiros e prepotentes dominem a mente do homem? Até quando?