abril 12, 2019

JEAN WYLLYS: DO BIG BROTHER AO AUTO-EXÍLIO





A entrevista do ex-deputado Jean Wyllys ao Pedro Bial, levada ao ar nesta madrugada de 10 de abril de 2019 foi, além de comovente, um momento para lembrar um fato que nos passa despercebido na história recente do Brasil: o processo de idiotização da população brasileira. 


Em 2005, o ex-deputado participava do reality da Globo e foi escolhido para o paredão na primeira votação entre seus pares, por um número expressivo de votos. Não teve dúvidas e escancarou o motivo: preconceito, homofobia, por ser gay. 


O Brasil começava, nesse ano, um ciclo virtuoso de crescimento, de bem-estar social, de mudanças de mentalidade, de perspectiva de melhorias em todos os setores. O povo começava a perceber que podia, sim, confiar no presidente que elegera e que dera início a uma série de medidas de proteção social. Havia confiança. As mazelas tradicionais – pobreza, preconceito racial, homofobia, sexismo etc. – começavam a ser discutidas de forma racional e incisiva. Não se resolviam ainda, mas andava a caminho uma política de tolerância que prometia frutos de médio e longo prazos. 


O povo que assistia ao BBB solidarizou-se com a luta da militância LGBT e não só salvou Jean Wyllys da eliminação, como levou-o a ganhar o prêmio máximo do programa. Começava aí a trajetória de sucesso de um garoto miserável que lutara a vida toda contra a pobreza e o preconceito: na política, eleito deputado, recebeu prêmios por sua atuação, por sua militância e, ao mesmo tempo, começou a incomodar as forças conservadoras que o levaram a renunciar ao terceiro mandato, por ameaças de morte vindas até de autoridades. 


O que mudou nesses 13 ou 14 anos, para o país se tornar um poço de ódio, preconceito, racismo e homofobia? 


Nessa década meia, observemos um fenômeno: o crescimento exponencial das igrejas evangélicas, comandadas por indivíduos inescrupulosos e fundamentalistas que, ao lado da exploração da fé do povo através dos dízimos cobrados, obtiveram fortunas e poder. 


Caíram como um bando de gafanhotos famintos sobre a população mais desassistida intelectualmente, aproveitando-se do enfraquecimento da Igreja Católica, enfraquecimento esse ocasionado não só por escândalos, mas também porque a ICAR deixou um pouco de lado a evangelização, que era o seu forte até os anos setenta, mais ou menos. Abriu um flanco pelo qual entraram os tais “pastores”, com a bíblia na mão, prometendo curas milagrosas, prometendo o paraíso e, mais importante, condenando de forma peremptória e feroz tudo aquilo que achavam que era pecado. Cura gay, exorcismos, acolhimento caloroso aos fiéis, orações coletivas, pregações insólitas, truques de curas, controle do corpo dos fiéis, através de proibições e ameaças de fogo eterno, enfim, tudo quanto em termos de discurso amedronta e toca o mais íntimo das pessoas foi usado para arrebanhar multidões, engordar os cofres das igrejas, enriquecer os tais pastores que, mais uma vez numa jogada de marketing certeira, puderam avançar sobre a mídia e comprar várias emissoras de televisão e construir templos faraônicos, num círculo - vicioso para o povo e virtuoso para eles - de dinheiro, controle da mídia e poder. 


Inculcaram na população, com a força da palavra de deus, da bíblia e de todos os artefatos fundamentalistas, conceitos ultrapassados e preconceitos que estavam quase adormecidos, os quais ressurgiram com a fúria dos que temem a contaminação do pecado ao simples contato com o pecador. E o pecado pode ser a homossexualidade tanto quanto a promiscuidade. A velha máxima de repetir mentiras até que se tornem verdades. A velha máxima de controlar os corpos para controlar as mentes. Sexo? Só com a bênção de deus e para procriação. Mulher? Só dona de casa e sob o tacão do marido. Política? É podre, é suja, a não ser que se elejam os homens de deus, ou seja, os próprios pastores. E a bancada evangélica de 2019 é, historicamente, a maior de todos os tempos. Inaugurou-se e impôs-se o atraso. Recuamos não aos tempos bíblicos, mas aos tempos cinza que permitem o controle de um povo que, de repente, descobre ou redescobre – de uma maneira torta – que só há esperança na palavra de deus, na salvação eterna etc. 


Não foi essa força avassaladora de extremismo e de obscurantismo a única responsável pela situação de total estupidificação do povo, mas foi sem dúvida uma força poderosa para que isso acontecesse, para que se elegesse uma besta fundamentalista desconhecida para a presidência do país. 


Com tudo isso, Jean Wyllys, um deputado que ia para um terceiro mandato de sucesso, que, se não tinha a unanimidade da opinião pública, tinha o seu respeito, viu-se de repente no meio de um turbilhão de ameaças físicas e ameaças de morte e, sentindo que não teria condições de exercer com dignidade a função para a qual foi eleito, acabou por renunciar e exilar-se na Europa. Porque, se ficasse, sem dúvida, teria o mesmo destino de sua amiga pessoal e colega de partido, a vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada a mando de uma “poderosa família de políticos do Rio de Janeiro”.



abril 05, 2019

ESTOU COM MUITO DÓ DOS HUMORISTAS BRASILEIROS


(James Guentner)


A profissão de humorista, no Brasil, passa por uma séria (sem trocadilho) crise. Estou com muito dó deles. Bate-lhes à porta o desemprego; bate-lhes à porta o desprestígio; bate-lhes à porta o não ter mais como fazer graça; bate-lhes à porta o fato de que há um fato irreversível: quem vai pagar para ouvir uma piada, nos dias de hoje? 

Os programas humorísticos da televisão vão perder os patrocinadores; os teatros vão-se esvaziar; os humoristas, coitados, passarão a ser vistos, todos eles, como amadores, incompetentes, por não mais conseguirem fazer rir ao povo. 

Lembro os antigos programas e seus grandes nomes: Chico Anysio, Jô Soares, Costinha, Agildo Ribeiro, Manuel de Nóbrega, Juca Chaves, Grande Otelo, Oscarito, etc. etc. etc.; aí estão tantos outros das novas gerações: Tatá Wernek, Marcelo Adnet, Eduardo Sterblish, Fabio Porchat, Rafinha Bastos, Gregório Duvivier, Bruno Mazzeo, etc. etc. etc. – todos eles agora e por algum tempo (é o que se espera) relegados à condição de expectadores inertes de uma realidade totalmente surrealista, a de que não têm mais graça! 

Puxa vida! Nem mais uma piada profissional! Nem mesmo aquelas politicamente incorretas? Nem piada de português, nem racista, nem misógina, nem homofóbica. Até piada de papagaio perdeu a graça. Nada, nada mais que eles digam tem o condão de fazer povo gargalhar, ou dar uma risada, ou um riso sem graça. Sem graça? Sim estão todos sem graça! De repente, ficaram mudos nossos humoristas, embasbacados pelo que anda por aí... 

E o que anda por aí, que embasbacou nossos humoristas? O que está acontecendo que humilhou os mais hábeis piadistas? Que fez o público olhar para eles com cara de ué, e dizer: que é isso, caras? Atualizem-se. Vocês são agora meros bobos da corte sem corte, e até ficaram mais bobos do que bobos da corte, porque suas diatribes piadísticas encontraram concorrentes de peso, embora amadores. 

Sim, meus amigos, surgiu uma nova trupe de humoristas amadores, mas com uma força tremenda de fazer rir, com um repertório absurdo de piadas, com uma capacidade de renovação diária de chistes e gozações, com, enfim, aplomb impossível de ser alcançado por quem passou a vida toda fazendo rir e agora perde o bonde da história, perde a graça, perde as plumas. 

E essa trupe fantástica se instalou no centro do País, com todos os holofotes, com toda a mídia a espalhar e multiplicar para todos, diariamente, seus chistes, suas piadas, seus ditos engraçados, para a gargalhada geral do povo, com um repertorio realmente impressionante, diretamente do Palácio do Planalto, desde o dia primeiro de janeiro do ano da graça (do riso e do escárnio) e da desgraça (dos humoristas e... ai!... de todos nós) de 2019. 

Chorem todos os humoristas, que perdem e perderão seus empregos. Chorem agora, que o povo... bem, o povo vai chorar, sim, mas vai demorar um pouco. Por enquanto, o povo gargalha e ri, como o palhaço triste de um velho soneto.




(P.S.: quem deve estar rolando de rir é o FHC, que passou a faixa de pior presidente da história para o coiso).