outubro 28, 2016

PORQUE PESSOAS COMO DILMA E MADURO NÃO NECESSÁRIAS









Já não se discute se houve ou não golpe no País. Está mais do que claro e provado que a balela do “respeito à Constituição” serviu de escudo para uma das mais bem tramadas conspirações da direita hidrófoba do Brasil, para nos transformar, em pleno século XXI, na vergonha do mundo, numa nova “república de bananas”, onde por qualquer motivo se dá um golpe de estado.

Também não é necessário voltar às causas do golpe: o governo Dilma Rousseff irritou profundamente uma certa classe financeira, que se rebelou, e é claro, financiou o golpe, através de uma sórdida campanha na mídia que sempre foi golpista, nas mãos das famílias de extrema direita que a dominam e zombam de palavras, como as da atual presidenta, sim, presidenta, do STF, a bradar por respeito à “liberdade de imprensa”, como se isso existisse por essas plagas. Sim, há liberdade de imprensa para a grande mídia, mas não para os jornalistas que nela trabalham. Há “liberdade de imprensa”, não de opinião. E não existe liberdade de imprensa, quando qualquer mídia alternativa, que não viva à sombra ou das sobras das grandes famílias dominadoras, não consiga sobreviver, para veicular opiniões diversas daquelas que é consagrada e oficializada por essas famílias.

O pretexto para o “golpe constitucional” (Ulysses Guimarães que, com todos os seus defeitos, não era golpista, nunca sonharia que sua Constituição Cidadã serviria um dia de escudo para tal canalhice, deve estar se remoendo, onde quer que esteja) é pífio e não resiste à lógica mais elementar. No entanto, o golpe foi aprovado por um Congresso vendido e comprado a peso de milhões, pagos, em primeira instância pela FIESP e demais congêneres, e, em segunda instância, pelo títere que se senta hoje na cadeira presidencial, através de medidas econômicas de interesse dos golpistas e distribuição de benesses a estados e municípios, através dos deputados e senadores que apoiaram o golpe. Uma das mais tristes páginas de nossa história, com absoluta certeza.

Mas isso são águas passadas. O que eu quero mesmo falar é sobre um certo raciocínio que vigora entre muitas pessoas de esquerda ou ditas de esquerda. E abro um parêntese para uma crítica severa a movimentos, partidos, associações e quejandas que se dizem de esquerda, mas que criticaram ou criticam posturas do partido que esteve no poder nos últimos dez anos, no Brasil, o Partido dos Trabalhadores. Primeiro, lembrar que o PT obteve vitórias históricas e significativas em todos os terrenos políticos, econômicos e sociais, algo absolutamente notável, num País dominado pelo conservadorismo, doutrinado por entidades conservadoras, enganado por mídias conservadoras, o que o habilita a ter todo o respeito possível de quaisquer grupos, grupelhos, partidos e organizações de esquerda não só do Brasil como de todo o mundo. Segundo, lembrar que seu líder máximo, Lula, tem o respeito e admiração de praticamente todos os países, por sua obra de resgate da pobreza, por suas posições moderadas e conciliadoras e por sua capacidade não só de realizar, mas de aglutinar através do diálogo forças e ideias diferentes e até contraditórias, conseguindo, com isso, a tal governabilidade que a Constituição Cidadã deixou como uma bomba de efeito retardado para todos os presidentes. Portanto, quaisquer que sejam as ideologias que estejam no espectro oposto ao direitismo arraigado de PSDB, DEM e demais asseclas, a formar uma quadrilha aguerrida de defensores do liberalismo econômico e até do capitalismo mais selvagem, advirto que críticas públicas ao PT, a Lula ou a Dilma, tendo ou não razão, mesmo que consistentes ou baseadas apenas em teorias, só servem para divertir a direita e aprofundar divergências que não levam a nada. São estúpidas manifestações de inveja ou de incapacidade de perceber e ler corretamente o contexto e as consequências do que isso pode trazer. O PT, com todos os seus erros e acertos, não está acima de críticas, entendam bem. O que eu quero dizer é que não pode haver divisões em momentos de crise. O que eu quero dizer é que é burrice tentar buscar no PT e no governo Dilma as razões para o golpe. E entro, agora, finalmente, no cerne da questão deste texto: a estupidez de culpar a vítima pelo ato criminoso do outro.

Sim, exatamente isso. Busca-se, em alguns textos e comentários que se leem e se ouvem por aí, dizer que a presidenta Dilma é, por exemplo, muito radical em suas posições, tanto no aspecto político quanto no econômico. Que ela cutucou a onça com a vara curta. Que provocou o mercado com medidas que irritaram os financistas e os ditos rentistas que vivem do poder dos juros altíssimos. Que ela provocou a fera do Norte, ao se aliar aos BRICS e a países como a Venezuela e a Argentina de Cristina Kirchner (outra que sofreu um “golpe eleitoral”, por suas posições). Que irritou ainda mais o governo estadunidense ao criar com os demais países dos BRICS um novo banco de financiamento internacional e pregar a futura substituição do dólar por uma nova moeda, o que significa pregar uma nova ordem mundial de comércio. Enfim, que a presidenta Dilma é que foi culpada do golpe que sofreu. Isso é o mesmo que criminalizar a vítima de estupro, porque provocou o estuprador. Constitui um dos maiores absurdos de qualquer tipo de pensamento, seja de direita ou de esquerda, mas torna-se ainda mais assustador quando vem de pessoas que se dizem de esquerda.


O mundo, meus senhores e senhoras, tem sido dominado há séculos por um capitalismo que alterna a selvageria econômica com a selvageria das armas, para saquear e destruir nações, matar milhões e milhões de pessoas e jogar outras tantas na vala mais cruel da miséria, da fome, da humilhação. Palavras corteses, gestos de boa vontade, pregações e lutas pontuais têm-se travado em todos os cantos do planeta, mas são plumas ao vento, que pouco têm arranhado a couraça paquidérmica dos capitalistas que dominam o mundo. O único temor desses capitalistas é a pregação radical através do empoderamento de pessoas como Chaves e seu sucessor, Maduro, como Kirchner, Dilma, Castro, Morales, Mujica e tantos outros pelo mundo afora, não importando o tamanho de seus países. Essas pessoas, os radicais de esquerda de todo o mundo, mesmo aqueles que nenhum poder possuem que não seja a força de suas palavras, são necessárias para dar um pouco de equilíbrio à estupidez capitalista. Eles, realmente, quase nunca são bem-sucedidos em suas empresas, mas incomodam os capitalistas pela grandeza moral de suas ações ou de suas palavras. E isso são sementes que podem gerar movimentos populares, quando o desespero bate à porta dos cidadãos oprimidos, que se lembram dessas pessoas e repetem as palavras dessas pessoas e tomam os exemplos dessas pessoas como bússola para suas tentativas, frustradas ou vencedoras, de sair da miséria e conquistar uma vida mais digna, menos humilhante.

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