Viver numa ditadura é fácil: as
regras são claras e desrespeitá-las implica punição, cadeia ou morte. Melhor seria
dizer: morrer numa ditadura é fácil.
Já numa democracia, a vida é mais
complicada. Porque significa pluralidade. E não só pluralidade, mas o direito
de ser diferente e de expressar essa diferença. E "pior": aceitar que
as pessoas pensem de modo diverso e sejam diferentes, que as pessoas possam
dizer o que pensam, sem medo de serem presas, de serem torturadas, de morrerem.
Ou seja: liberdade de opinião.
Liberdade total de opinião?
Talvez alguns pensem que sim. Mas
não é exatamente isso. Há regras. E uma delas se chama RESPEITO. Pode-se
opinar, sem dúvida. Mas não se pode deixar de respeitar o outro. Porque, numa
democracia, a liberdade de um termina onde começa a liberdade do outro.
Complicado isso. Muito
complicado. Onde está o limite, a linha divisória, a cal que delimita o meu
campo do campo do adversário, onde um atacante pode ser considerado
"impedido"?
Pois, é: o limite, a linha
divisória, a cal - essa coisa tão clara na ditatadura e que na democracia é invisível. Invisível, mas elementar e fundamental e não é uma linha,
não: é algo chamado bom senso.
E bom senso não tem na farmácia,
nem no supermercado, nem na feira. Não se compra, não se vende. Só se usa. E,
se usado mal, vira outra coisa, vira desrespeito.
E aí, já não há democracia que
aguente. Que se sustente.
Posso criticar o meu semelhante,
o meu vizinho, o gato do meu vizinho, como posso criticar o governador e a
presidenta da República. Sim, tenho esse direito. Temos todos esse direito, o
de criticar, o de opor a uma opinião a nossa opinião. De dizer sim, ou de dizer
não. De lutar por aquilo em que acredito.
Mas...
Ah! Essa adversativa, essa
maldita adversativa, que os totalitários odeiam. Ou só a usam a seu favor,
porque não conseguem entender os sutis mecanismos da democracia e a cospem de
suas falas, de seus textos.
Para eles, não há possibilidade
de oposição. Porque são os recalcados do pensamento único. E se alguém é
diferente, se alguém pensa diferente, é "pau na moleira dele", que
está marchando com pé trocado. Todos têm que marchar exatamente no mesmo passo.
Aliás, eles adoram uma "marcha", um "ombro-armas"!
São os patrulheiros do pensamento
alheio. Não largam nunca seus fuzis, suas metralhadoras giratórias, suas
granadas: o "inimigo" somos todos nós, que temos opinião e são todos
os que dizem ou fazem alguma coisa com a qual não concordam.
E, o pior: muitas vezes, não
concordam e se lançam ao ataque, sem nem mesmo entenderem o que o outro falou,
ou escreveu. Tudo é motivo de "patrulhamento": a piada mal contada, a
ironia não entendida, a crítica não assimilada, o posicionamento filosófico, a
opção sexual, o voto declarado, o apoio ou não a alguém...
Mas, não pensem que atacam com
argumentos, com ideias, com oposição. Não. As patrulhas atacam com o mais
rasteiro dos argumentos: o xingamento, a ofensa, a ameaça. O argumento dos que
não têm argumentos. E quando podem, com "carteiradas" - "sabem
com quem está falando?" "Não sou deus, mas sou juiz" (ou
delegado, ou deputado, ou... qualquer outra "otoridade")!
É quase impossível acabar com as
patrulhas. Mas, está na hora de se começar a dizer: chega!
Se quer discutir, discuta. Se
quer criticar, critique. Se quer opinar, opine. Sem patrulha, no entanto. Com
civilidade. Dentro das regras da democracia.
Chega! Chega de patrulhamento!
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