janeiro 26, 2014

A CRISE DAS CIDADES, DAS MEGA CIDADES





(Foto de Aurélio Becherini - São Paulo antiga)


São Paulo  completou ontem, dia 25/1/2014, quatrocentos e sessenta anos. Sem muito a comemorar. Embora seja um dos polos de desenvolvimento e de cultura do País, a mega cidade tem problemas crônicos que todo morador sabe de cor. Todos clamam por solução e protestam contra as condições de vida a que são submetidos, mas poucos oferecem sugestões de como serão resolvidas suas imensas carências.

"Tudo aqui é insuficiente. Quanto mais metrô se faz, mais insuficiente o metrô fica. Quanto mais hospitais se constroem e se instalam, mais hospitais são necessários. Quanto mais escolas se tem, mais escolas se precisa e menos ensino se consegue. Estamos no reinado de Alice do outro lado do espelho: quanto mais andava, mas distante ficava. Chegamos, finalmente, à lógica dos avessos. Nem o povo é inocente nessa história. Uma cidade que reclama da falta de transportes e queima ônibus todos os dias é uma cidade louca. É melhor chamar o Alienista, de Machado de Assis." Assim escreveu o sociólogo José de Souza Martins, num artigo publicado hoje no Estado de São Paulo.

Neste parágrafo está, para mim, a chave da compreensão da cidade de São Paulo: o crescimento desordenado da vila do século XIX para a mega cidade do século XXI, sem planejamento, sem respeito ao meio ambiente, sem pensar no futuro, ou seja, só tivemos governos municipais (e estaduais, que também se metem no planejamento da cidade) voltados para obras, para o imediato, para o aqui e agora.

Sim, colhemos o fruto - amargo - de décadas de mau planejamento. Isso todo mundo sabe. Isso todo mundo diz. Mas... e daí? Como sair dessa? Tem solução a cidade de São Paulo?

A doença é crônica e corrói não só São Paulo mas todas as mega cidades do mundo: chama-se explosão demográfica. Gente demais querendo viver num espaço exíguo. E gente quer casa, quer escola, quer água e esgoto, quer transporte, quer qualidade de vida. No entanto, é impossível prover tudo isso para uma população que explodiu de pouco mais de 4 milhões para 12 milhões em apenas quarenta anos. Mesmo que haja recursos - e, em parte, eles existem - tudo o que é necessário para tornar a vida melhor demora para ser feito. Não se fazem milhares de casas de um dia para o outro. Um quilômetro de linha de metrô demora meses para ficar pronto. Obras rápidas só no jogo de faz de conta de promessas políticas, ou na construção de pontes e viadutos que não resolvem absolutamente nada.

Digo e repito, por mais estranha que algumas pessoas possam achar a ideia: São Paulo precisa, primeiro, parar de crescer; segundo, começar a diminuir. Sim, diminuir. Somente um plano racional de esvaziamento da cidade pode garantir seu futuro. É estupidez nos orgulharmos de sermos tão grandes. Se, num barco furado, entram duzentos litros de água por hora e só temos capacidade de tirar cinquenta, quanto tempo levará para que esse barco afunde?

São Paulo está afundando em seus problemas porque há gente demais exigindo recursos demais, recursos que não são possíveis de serem colocados à disposição das pessoas em curto prazo. Recursos que se tornam obsoletos no momento mesmo em que são disponibilizados. É como enxugar gelo.

Então, o que fazer para diminuir a população de São Paulo?

Não, não pense que eu estou propondo expulsar a quem quer seja da cidade. Isso é higienismo e fascismo. A cidade precisa de sua população e de sua diversidade. O que não pode é abrigar um número exagerado de pessoas a demandar recursos de que não dispõe.


Há duas formas básicas de fazer com que a população diminua ao longo de duas ou três décadas.

A primeira é transferir a capital do Estado para o interior, para o centro do Estado, com toda a sua infraestrutura burocrática. Liberar a cidade do peso de ser a capital e abrigar centenas de órgãos públicos e toda a burocracia que os envolve, tornando-a, ao mesmo tempo, livre de atração de dezenas de pessoas que buscam a capital para a solução de seus problemas ou de realização pessoal. Creio que não é necessário fundar e construir uma nova Brasília para isso: há, por exemplo, São Carlos, bem no centro geográfico de São Paulo, que pode muito bem receber a honra de tornar-se capital (e esse é só um exemplo!).

A segunda forma é alocar recursos municipais, estaduais e federais para realizar um plano que permita a muitos cidadãos paulistanos morar fora de São Paulo e, ao mesmo tempo, aqui manter seu emprego, seu lazer, sua vida. Polos de atração a até 200 quilômetros da cidade - outras pequenas cidades, vilas, condomínios etc. - integrados à cidade por trens de alta velocidade (trem bala). Provavelmente o tempo de deslocamento entre esses polos e o centro será bem menor do que hoje se leva para ir de um bairro a outro vizinho, em horário de pico.

Prevejo, com essas medidas, uma redução de até um terço da população atual. E, com cerca de 8 milhões de habitantes fixos, até mesmo a atual infraestrutura já seria suficiente. Mas, o governo municipal teria ainda como melhorar a qualidade de vida de seus habitantes com medidas mais efetivas de despoluição de rios e do ar; de saneamento básico; de arejamento da cidade com o aumento de áreas verdes, parques, praças etc.; de mobilidade urbana; de permeabilização do solo, que diminuam os tormentos das enchentes; de recuperação das margens de rios e riachos, após o desenterramento de muitos deles; de ensino de qualidade; de mais lazer etc. etc. etc.

Enfim, teríamos uma cidade mais civilizada e menos violenta. Porque creio que a violência não é fruto de pobreza ou de imigrantes ou de outra coisa que não seja a excessiva aglomeração de pessoas. E São Paulo, repito, tem gente demais. E gente demais é sinônimo de conflito, de crise, por causa de demandas não atendidas e impossíveis de atender, porque, como disse o articulista citado, "quanto mais se anda, mas distante se fica" e, então, nem o Alienista pode dar jeito.


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