março 19, 2014

DURA LEX, SED LEX








Em política, só as ditaduras são absolutas; tudo o mais é relativo, absolutamente relativo. Nossa democracia, por exemplo: há liberdade de expressão, de manifestação, mas há também leis que regulam e, até certo ponto, relativizam tal liberdade, além do fato de que há temas sobre os quais a manifestação de posição favorável pode dar até cadeia, como racismo. Também somos livres para criticar nossa democracia, mas não pode haver liberdade absoluta de expressão para quem queira suprimi-la. Numa democracia, não se pode ser anti-democrático. Logo, em alguns aspectos, o regime democrático torna-se ditatorial, por mais que essa palavra nos cause asco. A diferença dos aspectos ditatoriais (e notem que nem usei aspas) de um regime democrático para os mesmos aspectos num regime ditatorial é que, no regime absolutista, a oposição a ele é tratada de forma absoluta, com prisão, condenação, prisão e, muitas vezes, morte, quase sempre sem julgamento, ou com julgamentos de cartas previamente marcadas. Já o regime democrático trata os opositores de forma relativa, levando-os às barras dos tribunais, sob leis o mais justas possível, com o mais amplo direito de defesa. E não se pode, e isso já é uma opinião estritamente pessoal, tergiversar com a aplicação da lei, pois, como sempre se disse, dura lex, sed lex.

Todo esse arrazoado vem a propósito do temor - justificado - de alguns setores democráticos com relação à convocação por um grupo de extremistas da direita de uma nova "marcha da família, com deus, pela democracia", de cunho claramente golpista e favorável à volta dos militares e sua ditadura. Que haja saudosistas dos tempos ditatoriais, não nos causa estranheza: muitos foram os apoiadores efetivos, com recursos e prestígio, aos militares da ditadura. Que sonhem com sua volta, para continuarem tendo os privilégios que tiveram, também é um direito deles, e um direito democrático. Já o fato de pregarem abertamente tal proposta ponho em sérias dúvidas se um regime realmente democrático deva permitir uma campanha contra os seus princípios. E conspirar, então - e conspiração parece existir nessa campanha -, merece com certeza que seus inspiradores e líderes respondam por seus atos e palavras nas barras dos tribunais, democraticamente, com direito claro à defesa, mas com um julgamento que não deixe dúvidas de que não se pode - pelo bem da democracia - ser conivente ou calar diante de ameaças ao sistema democrático que adotamos.


Querem se manifestar? Que se manifestem. Querem marchar com deus ou com o diabo? Que o façam. Porém, respondam, depois, pelos seus atos e palavras. Porque a tolerância democrática tem o limite de sua relatividade: não pode permitir-se a omissão diante de quem, de forma absoluta e absolutista, queira impor, de novo, um regime contrário aos princípios básicos e axiomáticos de um sistema democrático. Que se manifestem, portanto, os representantes da lei, com a justa dureza e isenção que exige o caso.

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