março 10, 2009

RESPEITO AO POVO QUE ANDA A PÉ

Itanhaém é uma cidade do litoral sul de São Paulo. Chega-se até lá pelo complexo viário Anchieta – Imigrantes e, depois, pela rodovia SP55, uma estrada moderna, duplicada, que divide a cidade ao meio, praticamente deixando de um lado as praias e do outro inúmeros bairros e vilas.

Eu disse estrada moderna?

Bem, de meu ponto de vista, não sei exatamente se a SP55 é uma estrada moderna. Dá, sim, conforto ao motorista. É bem sinalizada, bem policiada, com radares de controle de velocidade etc. E as duas pistas são divididas por muretas que impedem que um veículo desgovernado, por exemplo, invada o outro lado. Mas...

Bem, um dia, vindo de Itanhaém para São Paulo, por essa estrada, deparei com um fato curioso: bem embaixo de uma passarela, empoleirado sobre a mureta que divide as duas pistas, um rapaz aguardava tranquilamente o momento de aventurar-se entre os carros e alcançar o outro lado.

Isso acontece milhares de vezes, principalmente durante o verão, quando as vilas e bairros do outro lado da rodovia se enchem de turistas. Há passarelas, claro. Enormes, altas, com dezenas e dezenas de degraus, que o povo, por preguiça, por costume, por cultura, enfim, se recusa a utilizar.

É mais ou menos como as calçadas em parques, que pretendem conduzir o pedestre pelos gramados: há sempre trilhas naturais, que a população elege em detrimento dos caminhos planejados, por hábito, por motivos que nem desconfiamos, como as formigas que traçam insondáveis trilhas por onde todas passam.

Quem planeja ruas, avenidas, estradas, ou seja, os caminhos humanos, tem que respeitar também esses usos e costumes do formigueiro humano. Do povo que anda a pé. O povo, por exemplo, reclama por passarelas para atravessar avenidas e estradas, mas, não as usa depois de prontas. Por quê? Por comodismo, por que são muito altas, por que as pessoas têm preguiça ou pressa ou preferem o perigo à segurança? Por tudo isso e por motivos mais entranhados em seus cérebros, por desígnios que ainda não entendemos, mecanismos não compreendidos de nosso cérebro.

Então, o que fazer?

Pode encarecer uma obra, mas acho que a única solução para estradas como a SP55 e para avenidas em grandes cidades é que se planejem formas que permitam ao pedestre manter sua caminhada no mesmo nível, ou seja, sem subir ou descer: nada de passarelas, nada de túneis para os pedestres, ciclistas e até mesmo trânsito local. As rodovias e as avenidas bem planejadas devem passar por cima ou por baixo desses pontos de passagem do povo a pé, das formiguinhas que não gostam de mudanças em suas trajetórias.

Se o argumento for o preço da obra, que me perdoem os planejadores, porém mais vale uma obra cara que vidas perdidas pela falta de respeito aos hábitos e costumes das pessoas. É a competência humanista, ou humanitária, que quase sempre falta a nossos engenheiros e economistas: não basta ser técnico, tem que pensar no lado humano de uma obra, de qualquer obra.

Isto é ser moderno; isto é ser, talvez, pós-moderno: respeitar o povo que anda a pé.

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