julho 18, 2019

LAS BRUJAS






O emburrecimento de um povo é a estrada por onde marcha triunfalmente o despotismo, por onde caminha o fascismo. Esse emburrecimento teve a etapa do amortecimento dos sentidos, aquele momento em que se implantou a ideia de que “pior não fica”, ou “tentar o novo para ver no que dá”. Deu nisto: um governo que parece ter um plano de “comer pelas beiradas” a paciência do povo, de impor uma pauta ultraconservadora, através da nomeação sutil - apesar dos protestos, na maioria tímidos - de “gente de confiança”, ou seja, o pessoal que está realmente implantando medidas coercitivas, entreguistas e politicamente de acordo com o “pensamento estupidamente cristão” do mandatário. 

O que todos conseguimos apreender com muita clareza é que há forças reacionárias poderosas que estão por trás desse plano maléfico de transformar um país num quintal dos Estados Unidos, sendo as mais predadoras delas as grandes empresas multinacionais. Sabemos que o “grande irmão do norte” e seu presidente topetudo tem interesses políticos e econômicos; sabemos que há empresas multinacionais interessadas em nossas riquezas atuais e futuras. Tudo isso nós sabemos, mas são entidades difusas, citáveis, mas não exatamente passíveis de serem apontadas na rua, por exemplo, ou ter seu retrato nos jornais, com exceção do topetudo estadunidense, mas esse nós sabemos que é transitório, pode ser trocado daqui a dois anos. No entanto, seja que for o presidente lá os interesses deles aqui continuarão os mesmos. 

Estou falando especificamente do gato cujo rabo mal se consegue vislumbrar: estou falando do grupo de pessoas que planejam, em algum obscuro escritório da Avenida Paulista ou em Wall Street, as táticas de guerrilha que esse governo – estúpido como é – não teria capacidade de articular. 

É caso de dizer: no creo em las brujas, mas que las hay, las hay. Deve haver um staff comandado pelas tais forças superiores, para traçar os rumos, as medidas, indicar as pessoas a serem nomeadas, para redigir ou sugerir decretos, portarias etc. aos ministros e ao pessoal do segundo escalão. Vou denominar esse staff de “las brujas”, por falta de termo melhor e para dar a ele esse tom, não exatamente conspiratório, mas misterioso. 

Las brujas são o grupo que de fato manipulam o boneco articulado chamado Jair Bolsonaro, que tem intenções e maldades, mas é tosco demais para articular sutilezas, como soltar fake news, por ele próprio ou por um dos seus filhotes; desviar a atenção da imprensa e do público, com crítica, por exemplo, às taxas cobradas aos turistas ricos de Fernando de Noronha; articular uma embaixada para o filho 03 nos Estados Unidos, enquanto se nomeiam pessoas determinadas para cargos de aparente pouca importância, como diretores de reservas naturais ou áreas de proteção de interesse dos agricultores ou os outros títeres do ministério tomam medidas de desmonte do ensino público ou da saúde, etc. etc. etc. 

Deve ter saído de las brujas a tal reforma da previdência que destrói o sistema previdenciário baseado na tríplice contribuição – assalariados (1/3), patronato (1/3) e orçamento federal (1/3) – para despejar em cima apenas do povo a responsabilidade por sua aposentadoria, transformando esse povo em escravo do trabalho, para gáudio dos empregadores, e levando a que uma parcela significativa dos assalariados – aqueles que tenham renda acima da média – a buscar na previdência privada algum ganho suplementar, para a felicidade das instituições financeiras. 

E muitas outras medidas semelhantes virão por aí; nenhuma, absolutamente nenhuma, para a melhoria da situação do trabalhador, para amenizar a situação de miséria do povo. Se não acenou com nada até agora, não espere que isso aconteça. Toda e qualquer medida que esse governo – ou desgoverno, se preferir – tomar terá por objetivo beneficiar parcelas específicas da população, como o ensino familiar, ou outros grupos de interesse, como beneficiar o agronegócio ou agradar os evangélicos que o apoiam. 

Não está em curso uma conspiração, está em curso um processo claro de emburrecimento do povo, para que ele não perceba os caminhos traçados por las brujas, para que esse governo atinja seus objetivos obscuros de totalitarismo e de sujeição do País a desígnios torpes, muito torpes. 

Enquanto o presidente fake fala bobagens por aí, provocando riso e escárnio do mundo, por suas ideias toscas, como transferir a embaixada de Israel para Jerusalém, ou bater continência para a bandeira dos Estados Unidos, ou brincar com os líderes do Mercosul, com provocações infelizes, o grupo de las brujas deve estar manipulando o poder real, tomando medidas extremas de entreguismo contrárias ao povo, articulando formas de desmontar o Estado social e deixar para a inciativa privada (nunca um termo foi mais preciso para indicar a canalhice: privada) a administração de setores fundamentais para o bem estar social, sem falar na futura total privatização da Petrobrás. 

E a única liderança que tem voz, que pode ter um discurso que monopolize a oposição, porque tem autoridade, porque tem alcance internacional e, portanto, pode incomodar e até mesmo reverter essa situação, está, por artes e artimanhas de las brujas, cujo braço jurídico canalha é a operação lava jato e seus juízes veniais, aprisionado num cubículo da Polícia Federal em Curitiba. Todas as demais lideranças ou foram cooptadas ou foram dizimadas por processos espúrios ou não obtêm eco em seus protestos, porque a grande mídia os ignora de forma olimpicamente criminosa. Então, se não cremos nas bruxas, aceitemos que elas existem. Porque seu poder de destruição parece inconteste.



(Ilustração: Francisco de Goya - flying witches)



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