setembro 24, 2012

QUANTOS PECADOS DEUS PERDOA?






 (Artemísia Gentileschi)


Existem limites razoáveis para tudo. Até para a fé e a religiosidade.

Não posso levar a sério nenhuma religião. São todas, absolutamente todas, sanguinárias, excludentes e perversas.

Nem precisamos citar os crimes em nome da fé registrados no passado do cristianismo. As guerras santas. As cruzadas que tinham por objetivo matar e saquear populações árabes e muçulmanas, apenas porque eram árabes e muçulmanas.

Nem precisamos citar os horrores da fatwa islâmica, que condena à morte qualquer pessoa que contrarie seus princípios, emitindo opiniões que possam ofender um homem que viveu e morreu há centenas de anos e que, até hoje, comanda as mentes criminosas de seus seguidores.

Não, não precisamos citar todas as carnificinas promovidas pelos seguidores de deuses ou apenas de um dos deuses que o homem criou à sua imagem e, por isso, pregam a destruição do outro ou sua maldição para o quinto dos infernos de todos aqueles que não professam a mesma fé, através de seus chamados profetas ou padres ou aiatolás ou que nome se dê àqueles que são donos das mentes apodrecidas dos fanáticos de todas as crenças.

Deus é carnificina. Deus é morte. Deus é anti-humano, anti-humanidade.

Mas, também é perdão. Deus a tudo perdoa. Desde que o indivíduo se arrependa de seus crimes, por mais hediondos que sejam. Com certeza, deve estar perdoando, nesse momento mesmo, a Hitler e a todos os carniceiros da história da humanidade, a exemplo do perdão dado a um indivíduo chamado Florisvaldo de Oliveira.

Você talvez não o conheça por esse nome, mas se eu disser Cabo Bruno muita gente há de se lembrar.

E quem é o Cabo Bruno?

Cabo Bruno foi preso em 1983, acusado de ser um dos maiores matadores de jovens da periferia da zona sul de São Paulo. Em entrevista a jornais da época, dizia, orgulhoso, ter matado mais de 50 pessoas.

Não é portanto, um criminoso comum. Quem se orgulha de matar friamente mais de 50 pessoas, em qualquer lugar do mundo, seria considerado um indivíduo a ser afastado do convívio social para sempre. Não no Brasil: com suas leis criminais absurdas, um supercriminoso como esse pode ser posto em liberdade depois de menos de 30 anos de prisão.

Absurda é a lei, mas é a lei.

Chega, no entanto, às raias da insanidade, o que acontece em seguida com esse famigerado assassino, pois não existe ex-assassino, a não ser que revoguemos qualquer possibilidade de lógica.

"Convertido" à fé, ou seja, "arrependido" de seus crimes, o tal Florisvaldo ou Cabo Bruno, ao ser posto em liberdade, não apenas é acolhido pela comunidade de crentes da Igreja Refúgio em Cristo, de Taubaté, interior de São Paulo, como empossado como pastor dessa mesma igreja, em cerimônia pública e de "grande emoção" para todos os seus seguidores que, a partir de agora, passarão a ser ungidos pela mesma mão que ceifou a vida de mais de cinquenta jovens da periferia de São Paulo, numa das mais impressionantes sequências de barbárie já vistas até hoje nessa cidade.

O Cabo Bruno, o criminoso que julgava e matava suas vítimas, sem processo, sem possibilidade de defesa, fossem ou não culpadas, hoje é um homem "santo", porque o deus sanguinário dos cristãos de todos os tempos sempre perdoa àqueles que se arrependem, não importa o grau dos seus crimes, porque, está escrito que mais vale o filho que retorna ao seio do pai do que todos os outros que nunca pecaram. Ou mais ou menos isso.

E é longa a tradição cristã do perdão dos assassinos, dos criminosos, numa longa lista de "santos" e "santas". Não vale a pena citá-los. O que importa é que, por mais que berrem os seguidores desse deus "bondoso" e benevolente, isso é absolutamente contra todos os princípios humanos de justiça.

Mas, quem disse que os crentes - e uso a palavra para designar todos os deístas do mundo - estão preocupados com o humano? Quem disse que eles estão preocupados com a justiça dos homens? A eles só importa a justiça divina, aquela que nivela a todos os que se arrependem; somente importa o que vai acontecer com eles depois da morte, ou seja, serão todos acolhidos no céu ou paraíso ou seja o lugar para onde vão depois do tal julgamento final, para conviverem todos em harmonia eterna com esse deus tantas vezes vingador e tantas vezes misericordioso.

Ah, sim: a misericórdia desse deus só vale para os que aceitam sua vontade, claro! Para os demais, a porta do inferno é a serventia da fé.






(Nota: dois dias depois de publicado esse artigo, dia 26.9.2012, o Cabo Bruno foi sumariamente executado em frente à sua casa, em Pindamonhangaba, ao retornar à noite, de um culto na cidade de Aparecida do Norte).



Nenhum comentário: