outubro 14, 2021

VOCÊ RECONHECE ESSE NEGRO?




Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que visa a dar mais segurança jurídica ao reconhecimento de suspeitos de algum crime por foto ou, mesmo, por comparação do suspeito com outras pessoas.

Não posso julgar se o projeto é bom ou ruim, porque, muitas vezes, as boas intenções de uma lei esbarram na péssima redação dessa lei, deixando verdadeiras armadilhas jurídicas de que se aproveitam os advogados, para condenar ou absolver seus clientes.

No entanto, é importante que se dê menos peso ao reconhecimento facial por meio de fotos ou de apresentação de suspeitos para comparação, principalmente quando se está diante de indivíduos pretos ou pardos.

Isso, não só por causa da dificuldade inerente a esse reconhecimento, mas principalmente porque muitas pessoas “brancas” não têm olhos para ver corretamente as feições negras. O racismo histórico de nossa sociedade invisibilizou a população negra. O branco não olha realmente para o negro, apenas percebe sua cor, por isso não sabe reconhecer seus traços. Os olhos “brancos” não distinguem sutilezas nem mesmo de coloração da pele: há pretos mais pretos e pretos mais claros, uma vasta paleta de cores.

Também os traços de rostos negros revelam milhares e milhares de detalhes diferentes, assim como todos os humanos, mas os humanos brancos apenas veem “o negro”, não o indivíduo de cor negra, um ser humano como outro qualquer, reconhecível por suas características idiossincráticas. Para o humano “branco”, o humano negro é só uma massa uniforme e indistinguível de caracteres, como se todos fossem quase uma única pessoa, como se todo negro fosse igual ao outro.

É claro que essa minha opinião de que o “branco” não sabe reconhecer sutilezas das feições negras é uma generalização, para efeito de desenvolver um raciocínio de que há ainda muito a se fazer em termos de combate ao racismo em nossa sociedade e, portanto, não quero dizer com isso que todo branco seja racista ou que todos os brancos não tenham “olhos de ver” e reconhecer os pretos e pardos.

Feito esse esclarecimento, concluo dizendo ser de grande importância um projeto que realmente dê mais segurança ao processo de arrolar provas de um crime. E, principalmente, que as autoridades policiais e jurídicas passem a ver com muita desconfiança e com extremo cuidado os testemunhos baseados em reconhecimento facial, principalmente de suspeitos de cor negra. Nossas prisões estão abarrotadas de pessoas pretas inocentes reconhecidas mal e porcamente por testemunhas brancas, cujos olhos, obscurecidos pelo maldito racismo, não conseguem perceber diferenças e características absurdamente diferentes de uma pessoa para outra, quando se trata de pretensos suspeitos pretos ou, até mesmo, pardos.

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