dezembro 27, 2023

SÃO PAULO, A METRÓPOLE DESGOVERNADA

 

(foto da internet, sem indicação de autoria)


Final de ano: 2024 bate às portas da cidade desgovernada.

Desgovernado, adjetivo, tem, segundo o dicionário, os seguintes significados: 1. que não tem governo ou está mal administrado; 2. descontrolado (diz-se de veículo, animal de montaria).

Para qualificar São Paulo, uso o significado número 1 literalmente, ou seja, uma cidade que, na minha opinião, sempre foi mal administrada (com raríssimas exceções que, aliás, para repetir um clichê, confirmam a regra). Porém, ressalto que o significado número 2 cabe perfeitamente, de forma metafórica, a essa cidade que parece sem rumo, descontrolada, o que significa “sem futuro”, ou sem um futuro que seja lógico e possível.

Tenho batido nesta tecla, sempre que posso: São Paulo não pode continuar crescendo. São Paulo precisa frear seu crescimento e começar a andar para trás, ou seja, precisa diminuir.

Numa metrópole com 12 milhões de habitantes, é humanamente impossível haver qualidade de vida.

Se levarmos em conta as condições geográficas, topográficas, climáticas, hidrográficas e outras mais, uma população de 7 a 8 milhões de pessoas seria o limite para se ter algum grau de civilização ou civilidade, de condições de vida razoavelmente confortável, de possibilidade de dar à população o mínimo necessário para viver e conviver, sem muito sufoco.

Pensemos nas condições geográficas da capital paulista. Vivemos num planalto, com vales e montanhas, com centenas de rios, sem mais locais com condições de expansão sem que as distâncias se tornem quase impossíveis de serem transpostas. (Entre os extemos da cidade – da Zona Sul para a Zona Leste – já são mais de 80 quilômetros!) A cidade está literalmente cercada de outros municípios, que se tornaram, muitas vezes, cidades-dormitório, e que fazem parte do que chamamos “a grande São Paulo”, cujo número de habitantes extrapola em muito os 12 milhões a que nos referimos.

Para onde, então, cresce a cidade?

A cidade cresce para cima! Verticaliza-se. Permitem-se prédios cada vez mais altos. Com mais gente dependurada em apartamentos cada vez menores, em todos os bairros. Eu disse: todos! Porque a sanha dos empresários da construção civil não tem limites e essa sanha é devidamente alimentada por leis cada ano mais permissivas, aprovadas pela Câmara de Vereadores, cuja maioria ou é estúpida ou está a soldo dessa canalha que destrói a cidade em nome de seus interesses imediatos.

Expliquemos: cada prédio construído modifica o microclima, impedindo a circulação do ar, exigindo mais ruas asfaltadas, eliminando a cobertura florestal, impermeabilizando o solo, mais garagens para automóveis, mais transporte público (que anda a passo de tartaruga), mais água, mais esgoto, mais energia elétrica. Multiplique isso por milhares e milhares de prédios que se erguem ano a ano, década a década, por toda a cidade, em todos os bairros e chega-se a uma conta que não fecha.

O planalto onde se situa a cidade de São Paulo é uma bacia hidrográfica com centenas de rios, riachos e ribeirões. Onde eles estavam, em sua maioria? Nos fundos de vales. O que existe hoje nos fundos de vales da cidade, como o Vale do Anhangabaú, a Avenida 23 de Maio etc. etc. et.? Avenidas asfaltadas, por onde literalmente se arrastam milhares e milhares de veículos (São Paulo tem mais 8 milhões de veículos registrados!).

Quando chove – e as chuvas torrenciais têm-se tornado comuns na cidade, por vários motivos, como veremos adiante – para onde vai a água, se os rios, riachos e ribeirões estão encanados, canalizados, espremidos debaixo das ruas e avenidas? A resposta é óbvia: cada vez mais aparecem pontos de alagamentos e inundações. Nem é preciso falar o prejuízo que isso traz para os moradores...

Dissemos que cada prédio construído muda o microclima da região e a somatória dessas mudanças traz para a cidade a mudança de seu clima, com maior aquecimento, maiores bolsões de calor, agravados, atualmente, pelas mudanças globais do clima, com as quais todos se preocupam. Então, a cidade se torna mais quente, com mais evaporação, e consequentemente chuvas mais intensas... O efeito disso todos sabem e já a ele me referi acima.

São Paulo é um desastre urbanístico.

Um desastre urbanístico que começou nos inícios do século passado e que tem se agravado paulatinamente, ano a ano, com a estupidez de administradores que não tiveram nenhuma preocupação que não fosse a abertura de novas avenidas, de mais ruas, de enterramento dos rios, riachos e ribeirões como solução para as enchentes (uma solução, repito, estúpida), que privilegiou, principalmente a partir da metade do século passado, o automóvel, com a construção de novas avenidas (de fundo de vale!) , viadutos e túneis.

Um desastre urbanístico configurado, principalmente, com a entrega literal da urbanização da cidade às construtoras, permitindo cada vez mais que elas destruam parques, jardins, áreas verdes enfim, para o famigerado adensamento populacional, sem que os cuidados com transporte, saneamento básico etc. acompanhem esse crescimento exponencial.

Qual a solução para esse desastre urbanístico, que se chama São Paulo, e que parece aumentar a cada dia, para desespero dos paulistanos?

Uma breve observação: uma pesquisa, que pouco se divulgou e de que pouco se fala, realizada há alguns anos, traz um dado fundamental para o que consideramos como possível solução para os problemas cruciais da cidade de São Paulo. Perguntadas a respeito, cerca de 30% das pessoas que moram aqui declararam que gostariam de deixar a cidade, de morar em outro lugar ou de voltar para suas cidades de origem. E mesmo muitos paulistanos, se tivessem oportunidade, sairiam da cidade onde nasceram.

Está aí, na minha modesta opinião, a solução para os males da grande metrópole.

Os governos municipal, estadual e federal deveriam unir-se num plano coordenado que facilitasse a saída dessas pessoas da cidade, voluntariamente, com o incentivo de emprego, moradia, melhores condições de vida etc. em cidades ou mesmo em regiões agrícolas tanto do interior paulista quanto de outras cidades do país que pudessem, quisessem e se comprometessem com esse plano e recebessem o necessário incentivo para acolhimento das famílias que aderissem.

É claro que não é um plano de fácil execução, mas não impossível nem utópico, desde que haja vontade política de todos os envolvidos. Há regiões e cidades do Brasil que receberiam de boa vontade uma mão de obra razoavelmente promissora e especializada, já que se poderia até mesmo incluir no planejamento, como atração aos aderentes, cursos de formação ou de reciclagem, até mesmo para os filhos adolescentes desses futuros emigrantes.

Não seria um êxodo repentino, mas executado ao longo de vários anos, de uma década ou mais, que daria melhores condições de vida a centenas de milhares de cidadãos descontentes com a cidade grande, além de tonar a metrópole pouco a pouco mais viável, mais confortável e mais aprazível para os que aqui permanecerem.

Para isso, basta que São Paulo volte a ser governada por um prefeito de visão humanística, de vontade política, de trânsito entre todos os demais poderes, que não veja como loucura um plano como esse e que compre, portanto, a ideia e busque formas para viabilizá-la, para que ela – a cidade – encontre, enfim, uma saída que não seja essa corrida desgovernada para o caos que, aliás, já está batendo à porta de todos.

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