fevereiro 25, 2009

SAIDAS PARA A CIDADE DE SÃO PAULO

Inevitável a piadinha infame: as melhores saídas para São Paulo são os aeroportos e as estradas. No entanto, há um fundo de realidade trágica nisso. Porque, realmente as melhores saídas para os problemas da maior cidade do Brasil é, mesmo, a médio e longo prazo, primeiro a estabilização e depois o decréscimo de sua população.

É absolutamente inviável que 20 milhões de pessoas convivam numa mancha urbana única, constituída por uma cidade imensa, a própria São Paulo, mais suas dezenas de cidades satélites, que formam a chamada região metropolitana.

Aliás, o próprio conceito de região metropolitana, aqui, se esgarça e não tem o menor sentido, porque não há uma só tentativa séria de coordenação de esforços entre as várias prefeituras que compõem essa megalópole. É cada um por si e os problemas para todos.

Os problemas são tão imensos, que nenhuma política isolada e de curto prazo tem a mínima possibilidade de resolver a situação. E nenhum, absolutamente, nenhum prefeito de São Paulo, nesses últimos quarenta anos, teve a ousadia de propor um planejamento honesto e orgânico que freasse o crescimento dessa cidade.

Qualidade de vida é um conceito que não passa pela cabeça de nossos alcaides. Porque não conhecem o passado da cidade, não têm olhos suficientemente agudos para ler o presente e não se importam nem um pouco com o futuro.

Somente o planejamento de longo prazo pode pontuar ações imediatas que impliquem melhoria de vida para todos. E ações que respeitem o passado e a geografia da cidade, seus usos e costumes. Os erros se acumularam de forma tão devastadora, que somente políticas e medidas corajosas poderão começar a resolver a situação.

Se falamos em diminuição da população, isso não significa adotar políticas segregacionistas em relação a migrantes de outros estados, mas pensar em termos de planejamento familiar, de impedimento de novas ocupações de solo, de incentivo a que as pessoas busquem alternativas de trabalho e de vida em outras cidades do interior, que não sejam próximas à capital, até mesmo na possibilidade de mudança da capital do Estado para uma região central.

E dentre os inúmeros problemas desse caos urbano chamado São Paulo, a questão das águas é prioridade absoluta. O planalto onde se situa a cidade possui uma malha inumerável de rios, córregos e riachos. O que se fez até agora eu considero um crime contra a humanidade (sim, contra a humanidade!): canalizaram os córregos e riachos, retificaram rios, construíram ruas e avenidas sobre as águas canalizadas e, onde ainda há água corrente à vista, ocuparam suas margens de forma estúpida e criminosa. E mais: drenaram baixadas e várzeas, que alagavam e traziam vida à cidade e hoje continuam alagando e trazendo morte e destruição. Porque os rios estão mortos, mortos pela sujeira que o homem despeja continuamente em suas águas, desde a merda de milhões até dejetos industriais altamente perniciosos.

E as regiões de mananciais? Ocupadas desordenadamente pelos grileiros, um crime impune porque não os criminosos sãos os mesmos que sempre mandaram nesta cidade e continuam mandando. Seus comparsas estão em todos os poderes constituídos, prontos a permitir que loteamentos clandestinos proliferem, como forma de aumento de suas rendas. E a vilas e bairros irregulares surgem da noite para o dia, a jogar sua sujeira nas represas, a destruir os pequenos rios e riachos que as alimentam. Alguns milhares de ocupantes ilegais comprometem o presente e o futuro de milhões. E não há governo – estadual ou municipal – que tenha coragem de mover uma palha para tirar essa gente de lá.

A poluição, em todas as suas formas, deve ser combatida, mas a poluição das águas tem de ser prioridade absoluta. Milhões foram gastos em obras no rio Tietê. Obras? Sim, obras, obras de aprofundamento da calha, de retificação do rio, para domá-lo, para encaixotá-lo e estrangulá-lo ainda mais num canal de cimento, de milhões de sacos de cimento. Quando o rio queria apenas seguir seu curso, livre de esgotos, de sujeira, com margens amplas que lhe permitissem subir docemente nos tempos chuvosos e alagar as várzeas e dar-lhe vida e lazer para a população.

O rio não quer cimento, quer espaço. Simples assim. Mas isso implica em mudar a cabeça gorda de nossos dirigentes, implica mexer com gente que se diz dona absoluta dos destinos do povo, gente que nunca, em momento algum, se preocupou com algo que não fosse o seu próprio enriquecimento.

O povo? O povo que se dane. Ou busque as estradas para, simplesmente, ir embora, já que nem condições de usar os aeroportos esse povo sofrido tem.

fevereiro 17, 2009

ESTÁ ABERTA A TEMPORADA DE CAÇA AO GOVERNO LULA

Que tenho sérias restrições aos políticos brasileiros, o meu artigo anterior não deixa dúvidas. Não gosto deles apenas por ideologia, mas principalmente porque acho que formam uma casta de gente que é mais igual que os demais. Uma casta privilegiada. E odeio privilégios.

Ainda mais: não há dúvida de que uma boa parte dos que se dizem políticos não passa de uma caterva de salteadores dos cofres públicos. Incrustados em todos, absolutamente todos, os partidos políticos. E sedentos de poder, pois, para eles, poder é dinheiro. Que leva a mais poder.

Assim, não posso de todo discordar do desabafo do senador Jarbas Vasconcelos, ao dizer que há em seu partido, o PMDB, uma súcia de ladrões e outras coisas mais. Isso não é novidade para ninguém.

Agora, o que me deixa com a pulga atrás da orelha é o veículo que o ilustre senador escolheu para suas diatribes, que não ficaram apenas no âmbito partidário, mas pretenderam atingir o Governo Lula: aquela nossa caquética revistinha semanal porta-voz do PiG (Partido da imprensa Golpista).

É público e notório o ódio que essa revistinha desavergonhada cultiva em relação a qualquer tipo de governo que tenha um pouco (basta um pouco, apenas) de preocupação com o povo. Lula é populista e quer o terceiro mandato (esquecem-se os bravos articulistas e repórteres da tal revistinha que o golpe de um mandato a mais foi dado e comprado pelo senhor Fernando Henrique Cardoso, a quem ela defende de unhas e dentes). Chávez é ditador. Fidel, sanguinário. E vai por aí a fora.

Também é publico e notório que, para a tal revistinha, o próximo presidente da República (só falta empossar, claro) é o senhor José Serra, para quem ela tece loas e propagandeia a capacidade há muito, muito tempo. Ou seja, desde antes do golpe do senhor Alckmin contra o Serra, para sair candidato à Presidência. Como veem, há certos partidos que entendem bem de golpes e contragolpes, porque depois o mesmo Serra deu a volta no Alckmin, na eleição para a Prefeitura de São Paulo.

(Um parêntese: depois de se estapearam quase em público o ex e o atual governador de São Paulo, será quanto levou o senhor Alckmin para se encantar com o canto da sereia e tornar-se Secretário do Desenvolvimento do governo Serra, hem? Quanto? Ou quais benesses e promessas? Não acredito que tenha sido apenas um golpe contra o Aécio, não: nesse angu, tem mais caroço do que pululam as nossas panelas quentes).

Voltando ao assunto: a campanha presidencial de 2010, para esses capachos do capitalismo selvagem e do neoliberalismo mais selvagem ainda, já se iniciou no dia seguinte à derrota do PSDB, nas últimas eleições. E tome Serra!

Mas, o que tudo isso tem a ver com a entrevista do senhor Jarbas Vasconcelos?

Não creio em inocentes úteis. Portanto, acredito que a entrevista e o veículo foram propositadamente orquestrados. Com um fim, um único fim: dar início a uma campanha do PiG contra o Governo, com vistas às eleições do próximo ano.

Jarbas Vasconcelos deu a senha: está oficialmente aberta a temporada de caça ao governo Lula.

A partir de agora, uma enxurrada de opiniões de medalhões da oposição (que, a meu ver, fazem o que se espera de uma oposição; até aí, nada demais que demos e tucanos soem as trombetas); de denúncias de corrupção, geralmente baseados em pequenos desvios do sistema corrupto que consome o tecido da política brasileira, mas orquestradas de forma a atingir diretamente o presidente Lula; de reportagens exaltadas contra qualquer obra do Governo, como sendo de conteúdo eleitoreiro (em ano anterior à eleição, toda obra é eleitoreira, para a oposição); de exaltação às ações, por mais simples que sejam, dos adversários do Governo, como o melífluo governador de São Paulo; enfim, vamos ter de aguentar o mais sujo e promíscuo vale tudo do PiG, numa aliança dos grandes jornais e revistas, das rádios e seus comentaristas, das televisões e seus apresentadores, contra tudo e contra todos que estejam no Governo.

Enfim, 2009 está apenas começando. Quem tiver estômago fraco que saia de baixo, ou seja, faça-se de morto: não ouça, não leia, não assine... não veja!

fevereiro 04, 2009

UM CLÁSSICO DO CINEMA DE HORROR: A VOLTA DOS MORTOS VIVOS, DE DAN O'BANNON

O filme é de 1985. Recria, com sexo, drogas e rock’n’roll, um clássico de George Romero, Noite dos Mortos Vivos, de 1968. Um tema recorrente, portanto. E assustador: cadáveres que voltam à vida e se alimentam de cérebros humanos!

Brasil, 2009. Os mortos vivos fazem sua reentrée triunfal. E o pior: não é filme. Também não é o pesadelo que nos assusta em noites de tempestades e inundações. É realidade. Realidade vinda dos corredores e salões amplos do Congresso Nacional.

As duas cúpulas dos prédios projetados por Niemayer escondem perigos inimagináveis.

Mas, é melhor começarmos essa história pelo começo, para tentar encontrar algum sentido, se significado pode ter a ressurreição de tantos cadáveres (há um livro de Érico Veríssimo que trata também desse assunto, mas, por enquanto fiquemos com o filme, que está mais fresco na memória dos cinéfilos).

Não votei em Fernando Henrique Cardoso para presidente. No entanto, tinha-lhe certo apreço. E muito respeito. Afinal, era um homem de esquerda, ex-asilado político, professor emérito, intelectual reverenciado aqui e do outro lado do Atlântico. Tê-lo como presidente constituía, até certo ponto, motivo de orgulho, numa democracia incipiente como a nossa e depois dos desastres de governos anteriores (e não estou falando do regime de terror dos militares, não).
Enfim, democrata como sou, admirava FHC. Nos dois primeiros anos de governo. Aí, a coisa desandou: num golpe branco contra a democracia (porque não se pode chamar de outra coisa a não ser golpe o que aconteceu), o senhor Fernando Henrique Cardoso comprometeu seu passado e seu futuro político e o de seu partido – o PSDB – com a vergonhosa compra de um segundo mandato, via reeleição. Quebrou o Brasil duas vezes, para obter seu intento. E teve um dos mais pífios governos da história do Brasil, nos seis anos seguintes.

Reeleição. Um estatuto com o qual não concordo, nem em gênero, nem em número, nem em qualquer outra condição normal de temperatura e pressão. Inadmissível. E não concordo com reeleição nem para inspetor de quarteirão ou síndico de prédio. Ou seja: acho que se poderia ou deveria instituir um mandato de cinco ou seis anos, sem reeleição, para todos os cargos políticos, de vereador a presidente da República.

Por quê?

Para não termos de assistir à volta dos mortos vivos, que não voltam apenas uma ou duas vezes, mas sempre. Ficam lá, os mortos, pelos corredores do Congresso, esperando o momento certo de comer nossos cérebros e voltar ou voltar para comer nossos cérebros. Não descansam nunca, os mortos. Porque, a qualquer descuido, alimentados por paixões que não sabemos de onde vêm, alimentados pelas regras de um jogo sujo da política de reeleição a que nenhum político pode ou consegue escapar, de repente, eles abrem suas tumbas e ressurgem, impolutos, orgulhosos de seus trinta e tantos anos de vida parlamentar.

Isso acontece em Brasília e repercute em todas as mídias. Mas não é só lá, não, que os mortos vivos dão o ar fedorento de suas graças: em todas as câmaras municipais e estaduais, eles reaparecem com menor ou maior denodo, fazendo estragos, comendo cérebros.

E eles têm nomes, sim, os mortos vivos: chamam-se, no âmbito federal, José Sarney, Michel Temer, Collor de Mello, Heráclito Fortes, Renan Calheiros, Marconi Perillo, Mão Santa etc. etc. etc. Basta abrir os jornais, assistir aos noticiários da televisão, ouvir os comentaristas de rádios, que lá estão eles, firmes e fortes, sorridentes de seus podres poderes, famintos de nossos pobres cérebros, em seus ternos bem cortados e com suas gravatas de seda.

Culpados pela existência deles? Nós, pobres descerebrados, que os alimentamos com nossos votos, com nossa apatia, com nossa complacência.

Um horror, um verdadeiro filme de horror! Que não está em cartaz em nenhum cinema, mas em nossas consciências. E o pior: não tem sexo nem rock’n’roll. Só droga!